28.1.08

FONTES PRÓXIMAS DE SABINA WAN RECORDAM PASSAGEM DA EMPRESÁRIA POR MACAU
Saltos altos na corda bamba

A empresária Sabina Wan foi condenada a prisão perpétua na quinta-feira passada pelo Primeiro Tribunal Popular de Pequim, por ter burlado em cerca de 30 milhões de dólares norte-americanos um empresário de Hong Kong. O caso recordou a Macau a sedutora mulher, próxima da 14 Quilates, que fugiu do território e colheu abrigo junto do ex-presidente do Zaire, Mobutu

Sónia Nunes

Sabina Wan Soi Fan, a mulher que usou com destreza os dois poderes que tinha, a sedutora beleza e a destemida ambição, foi condenada a prisão perpétua pelo crime de burla de cerca
30 milhões de dólares norte-americanos. A sentença lida pelo Primeiro Tribunal Popular de Pequim na passada quinta-feira trouxe à memória o furacão em forma de diamante que há uma década passou por Macau. Sabina, a afilhada dum general do Exército Popular de Libertação, a amiga próxima do antigo presidente do Zaire, Mobuto Sese Seko, a empresária que apareceu de vestido comprido para ser julgada, fugiu e não voltou. A mulher que teve ainda o engenho de ver a idade nos passaportes português e da República Democrática do Congo reduzida em dez anos.
A misteriosa Sabina – a confusão biográfica não se resume aos documentos de identificação – chegou a Macau nos meados dos anos 80. Os negócios na área do imobiliário deram-lhe a fama e o dinheiro. Prosperou. Foi no território, ainda sob Administração Portuguesa, que fez o titular negócio da China: comprou um terreno e ergueu o edifício China Plaza, onde hoje funcionam os Serviços de Identificação. “Esse prédio era dela. Foi o grande investimento. Conseguiu comprar o terreno quando ali ainda funcionava uma escola e subiu as posições. Teve lucros cem vezes superiores. A Sabina fez negócios incríveis: comprava por dez, vendia por mil”, recordou ao PONTO FINAL, fonte próxima da empresária.
O esquema comprar barato, vender caro, nunca lhe valeu qualquer processo em tribunal. A especulação imobiliária não é crime e, de resto, fecha negócio quem aceite o preço. Sabina Wan, também conhecida por Wen Ruifen, seguia a tradição dos comerciantes chineses. “Para cada negócio constituía uma empresa. Tinha muito jeito e uma forma de actuar muito agressiva”, destacou a mesma fonte. E nos formalismos contratuais havia também ganas de lucro: por exemplo, a companhia era criada “com um capital de 100 mil patacas, e a cada acção correspondia muito mais”.
A determinação de Sabina Wan conhecia um único sinal de fraqueza: a empresária era viciada em jogo e perdia muito ao jogo. As dívidas terão fomentado a aproximação com o líder da 14 Quilates, Pan Nga Koi (vulgo Dente Partido) – embora haja também indícios que era ela, Sabina Wan, que dirigia a seita. “Que o Wan Kouk Koi era um tipo próximo dela, era. Tinham o mesmo nome [Wan]. Ele diria que eram primos. Acho que as ligações entre eles tinham que ver com o jogo. Ela pendurava-se no Pan Nga Koi para lhe sacar fichas”, avança fonte ouvida pelo nosso jornal.
As pistas que apontam Sabina para a liderança da 14K são mas mesmas que dizem que a transição de poderes para o “Dente Partido” ocorreu quando a empresária foi condenada em Macau pelo crime de sequestro e desertou – o que aconteceu antes de 1995, ano em que espoletaram as guerras entre tríades e que culminaram em 1999, quando Pan Nga Koi foi julgado no então Tribunal Superior de Justiça pelos crimes de associação criminosa, agiotagem e lavagem de dinheiro e condenado a 15 anos de prisão.

A mulher das Áfricas

Quando saiu de Macau, em 1995, Sabina Wan tinha dois processos em tribunal e chegou a estar presa preventivamente. Um dos casos tinha que ver com uma tentativa de sequestro; o outro referia-se a falsificações de documentos de identificação relativas ao marido, em que a empresária era tida como cúmplice.
Nos inícios dos anos 90, Sabina é acusada de ter mandado raptar um homem por dívidas de jogo. A lógica do crime visaria reter o indivíduo em Macau, isolado, até aos familiares aparecerem com o dinheiro que pagasse as dívidas. Depois de uma das sessões do julgamento, que ocorreu à porta aberta e atraiu a atenção dos jornalistas, o carro da na altura arguida estacionou em frente ao canal de televisão português TDM. Sabina Wan mandou um dos empregados dizer ao departamento de informação para não passar qualquer notícia sobre a audiência. O pedido não foi aceite e a informação foi para o ar.
No processo de falsificação de documentos, a empresária foi condenada a seis meses de prisão. “As embrulhadas dela aqui tinham que ver com o jogo. Perdia e não tinha dinheiro para pagar. O marido é que se meteu com uns aldrabões para arranjar um passaporte de Moçambique. Arranjou uma falsificação de trazer por casa, para ele e cinco pessoas, e foram todos presos”, referiu ao PONTO FINAL fonte ligada ao processo. Sabina Wan terá sido quem forneceu o dinheiro para a operação e foi condenada por cumplicidade.
A retirada de Macau dá-se quando a empresária se apercebe que “se não saísse ia presa” e fez uma viagem transcontinental sem retorno: foi para África. “Esta é a faceta mais engraçada da Sabina: ela juntou-se ao poder local do Zaire e ao Mobutu. Eu ia com ela nessas viagens, quase como tradutor, já na fase em que o presidente vivia perto do aeroporto e estava sempre ponto a fugir”, refere fonte bem colocada.
Mobutu Sese Seko tinha afeição por Sabina Wan, talvez por ela ser, para além de bonita, sedutora. Tinha por hábito convidá-la para almoçar. Um repasto com talheres de ouro e vinho francês, numa casa de bom gosto estético. “Mobutu vivia num fausto que impressionava qualquer um. Houve uma vez em que nos foi buscar num avião enorme, que tinha um quarto lá dentro. Tivemos ainda uma reunião num iate em que ele nos foi buscar de helicóptero”, ilustra a mesma fonte.
No Zaire (actual República Democrática do Congo), Sabina Wan desenvolveu negócios ligados à exploração de minérios – “e de umas minas de diamantes ligadas ao Mobuto” – e recebeu o título de cônsul honorária. “Ela sabia que tinha um processo crime em Macau e convenceu-se, erradamente, que se tivesse um cargo diplomático teria alguma imunidade”, avançou fonte próxima da empresária. Foi nessa altura, que Sabina Wan tentou ser recebida em Macau, com o novo posto honorífico, pela Administração Portuguesa: “Entrou em conflito com o poder local. Queria ser recebida à força por Rocha Vieira, e ele nunca o fez”, destacou.
Sabina Wan manteve-se no país até à queda do regime de Mobuto, em 1997. Separou-se do marido (sem haver um divórcio oficial) e foi viver para Hong Kong com um ex-ministro do antigo presidente do Zaire. No entanto, na RAEHK a empresária continua a enfrentar questões com a justiça e acabou por sair da região e instalar-se – desta feita, em definitivo – na China. “Não sei muito bem porque é que ela desapareceu de Hong Kong. Acho que teve que ver com a identificação: ela ora se apresentava com passaporte português ou do Congo e os nomes não coincidiam”, contou a mesma fonte.
Sabina Wan tem hoje 55 anos mas nos títulos de viagem a idade é outra: 45. “Quando ela tratou da nacionalidade portuguesa arranjou um certificado de nascimento na China que a dava como dez anos mais nova. Ela era uma mulher muito bonita e uma vaidosa de todo o tamanho”.
As preocupações com os aspecto físico não se resumiam a ostentar oficialmente a aparente juventude. Numa das sessões de julgamento, sob olhar do juiz Sebastião Póvoas, Sabina Wan apareceu de “vison” e plena de jóias, apesar dos conselhos dos advogados de defesa lhe terem pedido para ser comedida na indumentária. “Ela parecia que ia para uma festa. De vestido comprido, em cada mão devia ter um milhão em jóias. O juiz perguntou-lhe se ela achava que estava bem vestida para estar num tribunal. Ela respondeu qualquer coisa como ‘Visto-me assim no dia-a-dia e vim de consciência tranquila. Não venho para fazer de pobrezinha’”, recorda um dos advogados.

Por fim, a China

Se em Macau, Sabina Wan nunca conseguiu dar qualquer uso ao cargo de cônsul honorária do Zaire, na República Popular da China servia-se da protecção de um general do Exército Popular de Libertação que a tratava como uma afilhada. “Numa das nossas idas à China, fomos recebidos principescamente. As pessoas sabiam que ela era próxima do general e respeitavam-na, o que lhe dava alguma cobertura dentro do pais”, referiu uma fonte. E acrescentou que até as filhas do militar a tratavam como uma irmã.
Sobre Sabina Wan há ainda a memória de uma personalidade a tender para a vingança, quando via os calcanhares pisados. Não consentia que os seus empregados se despedissem e “fazia a vida negra a quem se metesse com ela”. Era a mesma personalidade capaz de presentear os amigos ou quem com ela trabalhava e de demonstrar gratidão.
“A última vez que a vi foi em Pequim. Fui a casa dela, notei que vivia relativamente bem, mas não me disse o que fazia ou deixava de fazer. Seis meses depois tive conhecimento que ela fora presa preventivamente”, relata um amigo da empresária. Sabina Wam foi detida há cerca de um ano, acusada do crime de burla, e não lhe foi consentido receber visitas de familiares ou amigos. “Era uma mulher das Arábias, mas viva um bocado na corda bamba. Tinha um certa tendência para a aldrabice. Insinuava-se e mandava-se para a frente. Terminou mal”, observa uma fonte ouvida pelo nosso jornal.
Na passada quinta feira, a empresária Sabina Wan (ou Wen Ruifen) foi condenada a prisão perpétua pelo crime de burla de 30 milhões de dólares dos Estados Unidos. O Primeiro Tribunal Popular de Pequim sentenciou-a culpada por ter convencido um parceiro de negócios de Hong Kong – Henry Cheng Kar-shun, da empresa New Wordd Group – a investir no desenvolvimento de programas informáticos da Microsoft, sobre os quais a empresária dizia deter os direitos.
Segundo a agência Lusa, o caso remonta a 2003 quando a New World transferiu o dinheiro para um empresa com sede em Pequim e controlada por Sabina Wan. O montante terá sido usado pela empresária para pagar despesas pessoais como honorários de advogados. O empresário comunicou o caso às autoridades do Continente que acabaram por recuperar 90 milhões de renmimbis e confiscaram outros bens, no valor total de 17, 6 milhões de renmimbis.
Sabina Wan Soi Fan nasceu em Guangdong. De acordo com a notícia da Lusa, a empresária nunca se registou na embaixada de Portugal nem entrou na China com documentos portugueses. A possível protecção consular por parte da embaixada portuguesa em Pequim, lê-se, não será fácil uma vez que a empresária entrou no pais com um “salvo conduto de compatriota”, um documento de viagem que o Governo Central atribui a residentes de Macau e de Hong Kong e que, até ao momento, não reconheceu protecção consular a nenhum viajante com aquele título.

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