Manuel Apolinário, ex-director da Inspecção de Jogos
“Não foi feita justiça!”
O Major-General Manuel Apolinário acusa as autoridades de Macau de inércia na investigação da tentativa de homicídio de que foi alvo em Novembro de 1996. O processo foi arquivado logo em 1998, mas só recentemente foi disso informado
Ricardo Pinto
“Não foi feita justiça!”
O Major-General Manuel Apolinário acusa as autoridades de Macau de inércia na investigação da tentativa de homicídio de que foi alvo em Novembro de 1996. O processo foi arquivado logo em 1998, mas só recentemente foi disso informado
Ricardo Pinto
Foi a vítima mais mediática da onda de violência que assolou Macau na segunda metade dos anos 90. Manuel António Apolinário, então tenente-coronel e subdirector da Inspecção e Coordenação de Jogos, foi atingido à queima-roupa com dois tiros, na face e no pescoço, num fim de tarde de Novembro de 1996, em plena baixa de Macau. O atirador esperava-o num motociclo à saída do serviço, na Av. da Praia Grande, e fez fogo quando Apolinário acabara de entrar no seu carro. Pôs-se depois em fuga e até hoje não foi efectuada qualquer detenção relacionada com este atentado.
Manuel Apolinário acabou por sobreviver aos graves ferimentos de que foi vítima, regressando a Macau depois de alguns meses de convalescença em Portugal. No entanto, acabou por renunciar meses mais tarde às funções de director da Inspecção de Jogos, a que fora entretanto promovido, por razões de segurança. Deixou Macau em Agosto de 1997 e só cá esteve em mais uma ocasião, já no último ano de administração portuguesa, para depor no julgamento de Wan Kuok Koi.
Hoje radicado em Lisboa, e já com a patente de Major-General, Manuel Apolinário confessa-se muito afectado ainda pelo atentado que quase lhe custou a vida. E tudo piorou quando foi recentemente informado de que nem tudo terá sido feito para capturar os autores do ataque, como explicou nesta sua primeira entrevista desde o atentado.
PONTO FINAL - A leitura que se fez na década de 90 sobre as origens da violência em Macau – que passariam por uma luta entre duas seitas pelo controlo dos negócios que se desenvolviam nos casinos ou à margem deles, bem como pela necessidade dessas seitas se encontrarem em posição de força à data da transição – retratava bem a situação?
Manuel Apolinário - Tenho para mim e sempre tive, apesar de grande parte deste período me encontrar ausente do Território, que a criminalidade violenta que aí se verificou na década de 90 não foi consequência duma guerra entre duas seitas. Houve violência entre elementos de seitas diferentes, como aliás sempre aconteceu, mas tratando-se sempre de casos pontuais. A violência que naquela época se verificou, no meu entender, foi provocada em grande parte pela seita 14k, visando especialmente todos aqueles que:
– Se cruzavam nas áreas dos seus negócios escuros;
– Defendiam a legalidade e sabiam demasiado sobre a seita e seus sequazes;
– E, tal como afirmava o Wan Kuok Koi, também conhecido por Pang Nga Koi, todos aqueles que vinham a Macau roubar o que a eles (seita 14k) pertencia (referindo-se a jogadores de HK pertencentes a seitas ou não).
– Podia a Administração Portuguesa ter evitado que a situação tivesse conhecido uma deterioração tão drástica?
M. A. - Julgo que sim. Conhecendo-se os Cabeças de Dragão e os principais chefes de todas as seitas, para acabar com a criminalidade violenta ou pelo menos reduzi-la, sempre fui defensor de que bastaria deter, com base nos sinais exteriores de riqueza, sete elementos das seitas e obrigá-los a fazerem prova da origem daquela. Da mesma forma, como eram conhecidos os principais mafiosos de HK que frequentavam os casinos, bastava proibi-los, temporariamente, de entrarem no Território.
– A nomeação de Marques Baptista para a direcção da Polícia Judiciária ajudou a resolver ou a complicar o problema?
M. A. - Sempre considerei a PJ como elemento fundamental no combate à criminalidade. Contudo, este combate nunca foi sólido, segundo penso, por falta de coesão dos seus elementos. Enquanto permaneci em Macau, sempre me pareceu haver diversos grupos dentro da mesma, actuando cada um deles de acordo com os seus pontos de vista. O Dr. Marques Baptista teve a capacidade de, rapidamente, se aperceber da falta de coesão na organização da PJ e das linhas de fractura existentes. Isto veio facilitar-lhe a sua acção de Comando. Independentemente das criticas que lhe possam ser feitas, julgo que, embora tardiamente, conseguiu cumprir a sua missão, pondo cobro às acções violentas da 14k, através da prisão dos seus principais chefes, trazendo a paz ao Território e dando à PJ alguma coesão.
– Quando foi baleado, as explicações avançadas para o atentado oscilavam entre o seu empenho em libertar os casinos da influência das seitas, nomeadamente através da colocação de guardas gurkhas nas salas de jogo, e a sua acção anterior enquanto chefe do serviço de informações da polícia. Em sua opinião, o que foi mesmo que motivou o atentado?
M. A. - Estive em Macau por duas vezes, no cumprimento de missões bem distintas. A primeira, entre 02.10.1986 e 10.07.1993. Neste período desempenhei, praticamente a tempo inteiro, as funções de Chefe da Repartição de Informações (RI/PSP) e em acumulação diversas outras, entre as quais realço as de Chefe do Serviço de Migração, Chefe do Serviço de Identificação da PSP, Oficial de Ligação com as Autoridades da RPC e responsável pelas Operações Dragão e Indocumentados 90. A segunda, entre 02.10.1996 e finais de Agosto de 1997, na Direcção da Inspecção e Coordenação dos Jogos de Macau (DICJM). Sofri o atentado em 26.11.1996, isto é, menos de dois meses depois de regressar ao Território.
No dia 21.10.1996, apresentei, à consideração superior, uma proposta destinada a resolver ou pelo menos minimizar a acção das seitas nos Casinos, uma vez que a maior parte dos problemas que ali ocorriam, eram do foro policial e como tal estavam fora da alçada da DICJM. Naquela, entre outras medidas, propunha-se:
– A criação dum piquete misto, por casino, a funcionar permanentemente e constituído pela PJ, PSP e DICJM. Portanto, nunca fui defensor da contratação de gurkhas para as salas de jogo.
– O permanente controlo da sala de visionamento de cada casino por parte da DICJM e uma ligação directa ao Gabinete do Piquete;
– Um apertado controlo sobre os bate-fichas; etc.
No dia 02.11.1996, recebi uma informação, altamente credível, que veio do interior da seita 14k, informando-me que, em reunião da mesma, havia sido decidido atentarem contra mim. No dia 12.11.1996, com autorização superior, convidei o Wan Kuok Koi, para se deslocar ao meu gabinete, onde, na presença do intérprete e do Inspector Coordenador Francisco Amaral, mantive uma conversa com este, relativamente à situação no Território e nos casinos. Durante esta, aquele revelou uma grande instabilidade psíquica, admitiu ser o Cabeça de Dragão da seita 14k e, relativamente à guerra que diariamente se fazia sentir, afirmou que esta iria continuar com as seitas de Hong Kong, porque estavam a tomar conta dos casinos e a roubar o que era de Macau.
No dia 17.11.1996, o PNK viajou na TAP para Portugal. No dia 26.11.1996, pelas 18H45, sofri o atentado já referido.
– Regressou a Macau em 1999 para testemunhar no julgamento de Wan Kuok Koi. Disse tudo o que sabia? E crê que ficou então a saber-se o que verdadeiramente se passou nessa época?
M. A. - Estive presente no julgamento das seitas, em Outubro de 1999, por minha iniciativa. Relativamente às minhas declarações, limitei-me a dizer a verdade sobre o que me foi perguntado, não acrescentado nada sobre outros processos que se encontravam em fase de investigação. Portanto, julgo que não terá sido tudo esclarecido sobre os acontecimentos ocorridos na década de 90, pelo menos, da minha parte, ficou muita coisa por dizer.
– Incomoda-o de alguma forma que nenhum dos homicídios então cometidos tenham ido a julgamento? Pode concluir-se por um rotundo falhanço de quem teve responsabilidades na investigação dessa vaga de violência?
M. A. - Aqui só poderei referir-me ao processo-crime relativo ao atentado que sofri, pois foi o único sobre o qual fui interrogado, embora tivesse informações sobre outros casos, nomeadamente, sobre a morte do Inspector Coordenador da DICJM (Francisco Amaral). Claro que incomoda muito não haver julgamento e, sobretudo, vir a saber, nove anos mais tarde, que à data a que me desloquei a Macau para depor no julgamento de Wan Kuok Koi o meu processo já havia sido arquivado. Falhanço?! Falhanço sem dúvida! Mas... que tipo de falhanço?
– Logo após o anúncio do acórdão que condenou Wan Kuok Koi a 15 anos de prisão, noticiou-se em Macau e Hong Kong que ele iria regressar a tribunal para responder pelo atentado contra a sua vida, o que acabou por nunca acontecer. O que acha que foi que travou esse processo?
M. A. - Admira-me que o processo-crime relativo ao atentado que sofri, tenha sido arquivado sem ter ido a julgamento. E pior que tudo isto, está o facto deste ter sido arquivado em 23.10.1998, sem me ter sido comunicado, apesar de ser o único interessado. Para saber o que se passava com o processo, depois de inúmeras diligências, fui obrigado a escrever uma carta ao Sr. Procurador de Macau, em finais de Janeiro de 2007 e, posteriormente, em Julho de 2007, à secretária para a Justiça, Drª Florinda Chan. A resposta chegou-me nas vésperas do último Natal (Dez.2007), após inúmeras outras diligências da minha parte. Claro que tudo isto me entristece e me faz perder a confiança na Justiça.
– Para vários observadores, alguns dos responsáveis pela onda de violência dos anos 90 continuaram até hoje em Macau, em liberdade, a fazer os seus negócios como se nada se tivesse passado. Partilha desta opinião?
M. A. - Julgo que uma boa parte dos principais responsáveis pela onda de violência que se fez sentir em Macau na década de 90 foram condenados no Processo das Seitas. É verdade que a maioria dos autores materiais dos crimes que então ocorreram não foi condenada. Naquilo que me diz respeito, que posso fazer quando a Justiça arquiva o processo relativo a um crime público em 1998 e só me dá conhecimento em 2007, depois de inúmeras diligências da minha parte, apesar de eu ter acusado concretamente determinadas pessoas? Eu bem gostaria que me tivesse sido feita justiça, mas houve alguém que não o permitiu! Quem? Não sei.
– Como vê a evolução recente de Macau no capítulo da segurança?
M. A. - Apesar de continuar a ter por Macau e pelas suas gentes uma admiração e um carinho muito especiais e de ainda considerar Macau como a minha segunda terra, logo a seguir ao meu local de nascimento, nos últimos anos, fruto do descontentamento provocado pela evolução que tomou o processo-crime relativo ao atentado que sofri, fui-me distanciando dos assuntos relacionados com a RAEM e tudo o que sei, foi aquilo que li na imprensa. Portanto, pouco sei da situação actual de Macau em termos de segurança. Contudo, julgo que Macau está bastante mais seguro do que esteve na década de 90 e por razões que me parecem óbvias:
– Macau foi integrada na RPC como RAEM;
– Alguns dos principais responsáveis pela criminalidade na década de 90 foram condenados a penas de prisão;
– O jogo, enquanto principal fonte de receitas de Macau, expandiu-se, diversificando a sua actividade por diferentes concessionários e locais de jogo, o que, naturalmente, conduziu à dispersão das seitas e dos seus sequazes.
– Uma das possibilidades que mais se temia em 1999 era que as seitas conseguissem implantar-se fortemente em Portugal beneficiando de várias circunstâncias favoráveis resultantes do processo de transição. Acredita que isso acabou mesmo por acontecer?
M. A. - Julgo que as seitas ou elementos a elas ligadas nunca pensaram abandonar o Território antes da sua entrega à RPC. O que alguns elementos fizeram foi preparar um plano alternativo que lhes permitisse afastarem-se de Macau, caso a entrega não corresse de feição para os seus interesses. Como a grande maioria desses elementos era titular de Passaporte Nacional, o plano alternativo passava por Portugal ou qualquer outro país da União Europeia. Depois da minha última estadia em Macau, em1996/1997, deixei de ter qualquer dúvida que seria assim que se passaria, isto é, só teríamos elementos das seitas em Portugal ou noutros países da UE, se a transição não corresse normalmente, o que não era de todo previsível.
– Acredita que as tríades possam ser eliminadas, ou há sempre que encontrar formas de acomodação com elas?
M. A. - As causas que estão na origem e aparecimento das tríades, também conhecidas por seitas, têm um cariz histórico; contudo, logo que estas desaparecem, os seus fundamentos são desvirtuados e substituídos pelos princípios do crime organizado, aproveitando, essencialmente, a sua organização inicial. Enquanto o Mundo for dominado pelo egoísmo e pela luta de interesses e continuar dividido entre ricos e pobres, as seitas encontrarão formas de sobreviver. Por isso, eu não acredito que elas possam, num espaço de tempo razoável, ser eliminadas ou auto-dissolverem-se.
– Receia ainda pela sua segurança, pelo desencadear de alguma operação de vingança?
M. A. - Nos dias que antecederam o atentado que sofri, apesar de me encontrar ameaçado, nunca receei pela minha vida. É verdade que tomei algumas medidas, especialmente durante a noite, razão pela qual arriscaram fazê-lo à luz do dia. Continuo a seguir o princípio de vida que diz: "Quem não deve não teme". Em consciência nunca prejudiquei fosse quem fosse, por isso, não tenho nada a recear, quer aqui em Portugal, quer noutra parte do Mundo qualquer.
– Ainda recorda com frequência os momentos em que esteve entre a vida e a morte? Que impacto teve esse momento na sua vida?
M. A. - Esse acontecimento teve e continua a ter em mim péssimas repercussões, nomeadamente, a nível psicológico, físico e profissional, sobre as quais não gostaria de falar.
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Simões Redinha, ex-Procurador Geral Adjunto
“É comum processos ficarem
a aguardar melhor prova”
“É comum processos ficarem
a aguardar melhor prova”
Quando Manuel Apolinário foi vítima de atentado e o seu processo arquivado, o responsável máximo pelo Ministério Público em Macau era Simões Redinha, que substituíra Leal de Carvalho no cargo de Procurador Geral Adjunto, depois de ter cumprido três anos como juiz do Tribunal Superior de Justiça. Ouvido agora para explicar por que razão o processo foi arquivado apenas dois anos depois do ataque, o antigo PGA começou por confessar não ter presentes os motivos, mas não deixou de adiantar uma possível explicação: “É comum processos serem arquivados e ficarem a aguardar melhor prova, sempre que as investigações não produzam resultados que permitam formular uma acusação”.
Simões Redinha, que concluiu entretanto a sua carreira de magistrado como juiz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo de Portugal, admitiu no entanto que Manuel Apolinário terá razões para se sentir revoltado, se de facto o arquivamento do processo só agora lhe foi comunicado. “As vítimas de crimes devem ser sempre notificadas imediatamente do arquivamento dos seus processos, até porque a lei lhes confere o direito de reagirem contra essa decisão”, explica. Daí que reconheça ter andado mal o Ministério Público em 1998, se de facto não fez chegar em tempo útil a notícia do arquivamento a Manuel Apolinário.
Quanto ao facto dos autores deste atentado e de muitos outros nunca terem sido apresentados perante a justiça, Simões Redinha não deixa também de reconhecer o falhanço das entidades que à data eram responsáveis pelas investigações, a começar pelo Ministério Público que dirigia. “Basta um crime de homicídio ficar impune para se poder dizer que as investigações falharam”, afirma.
Mas o antigo PGA faz também questão de apontar razões para esse falhanço. “Por um lado, havia forte infiltração das seitas nas polícias e, por outro, não nos podemos esquecer que a administração portuguesa estava à beira do fim”, sublinha. “Mas o que mais dificultou a missão do Ministério Público foi a decisão tomada pelo Conselho Judiciário em 1997 de dispensar cinco dos sete magistrados portugueses que estavam ao seu serviço. O Ministério Público foi decapitado por essa decisão”.
Simões Redinha recorda agora ter votado então contra aquela decisão, que tinha em vista acelerar o processo de localização de quadros na área da Justiça. “Nunca percebi por que razão se mandavam embora quase todos os magistrados experientes do Ministério Público, para mais num período tão conturbado, quando o mesmo Conselho Judiciário permitia que a maioria dos magistrados judiciais portugueses por cá continuasse até 99”, concluiu o antigo PGA.
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Quem foram os responsáveis?
Quem foram os responsáveis?
Quando regressou a Macau em 1999 para depor como testemunha no chamado mega-processo das seitas, Manuel Apolinário acusou Wan Kuok Koi de ter estado por detrás do atentado que quase lhe custou a vida. Mas a denúncia não produziu resultados palpáveis. O tribunal não estava a julgar homicídios ou tentativas de homicídio, apesar destes terem sido frequentes nos anos anteriores. A acusação contra Wan Kuok Koi e outros alegados membros da 14K reportava-se apenas ao crime de pertença a organização criminosa, e a outros menos relevantes. E o depoimento de Manuel Apolinário não conduziu então à abertura de um processo separado, apesar do South China Morning Post e outros jornais da região terem chegado a dar como certo que Wan Kuok Koi iria em breve voltar ao banco dos réus para responder por esse crime.
Dez anos volvidos, Manuel Apolinário parece manter as mesmas convicções relativamente ao ataque de que foi vítima, mas junta agora publicamente um nome à lista de suspeitos: a empresária Sabina Wan Soi Fan, acusada de pertencer também à seita 14K e que ele próprio deteve em Maio de 1992 por alegado envolvimento numa rede de falsificação de passaportes do Estado Português. “Desde essa data e até Julho de 1993, recebi inúmeras chamadas telefónicas ameaçando-me de morte”, recorda. “Sentia-se bem protegida, e não admira. Não esqueçamos que acompanhava e, publicamente, se passeava com personalidades portuguesas bem colocadas no Território, gozando de total impunidade. Fazendo-se passar por muito rica, conseguiu ligar-se a alguns elementos da alta sociedade de Macau, através de festas e passeios no seu Rolls Royce. Talvez um dia tudo isto possa ver a luz do dia!”
Sabina acabaria por ser colocada em liberdade provisória, deixando Macau pouco tempo depois. Desde então terá vivido longos períodos em Hong Kong e na República Democrática do Congo (ex-Zaire), de que foi cônsul honorária em Macau. O marido terá sido mesmo conselheiro pessoal do ex-ditador Mobutu Sesse Seko. Recentemente, o nome de Sabina Wan Soi Fan surgiu associado a um caso de fraude em Hong Kong e Pequim, tendo sido condenada a prisão perpétua por um tribunal popular da capital chinesa.
Tal como antes com Wan Kuok Koi, Manuel Apolinário não apresenta agora provas concludentes do envolvimento de Sabina no seu atentado, limitando-se a referir alguns factos e a extrapolar daí possíveis relações de causa-efeito. Mas se ele é o primeiro a admitir que jamais se reuniram provas irrefutáveis contra quem quer que seja, não deixa também de acusar as autoridades de revelarem pouco empenho na procura da verdade. “Agora que a Sabina está presa, por que razão ninguém vai lá interrogá-la sobre o meu caso”, pergunta em jeito de desafio, ao mesmo tempo que vai avisando de que não deixará de tentar convencer o Ministério Público da RAEM a retomar as investigações.
Da sua cela em Coloane, Wan Kuok Koi declinou fazer qualquer comentário sobre a entrevista de Manuel Apolinário, no que foi imitado pelo seu advogado, Pedro Redinha, que considera ser de toda a conveniência não interferir no processo de pedido de liberdade condicional apresentado pelo seu cliente, agora que cumpriu já dois terços da pena de 14 anos e meio de prisão a que foi condenado.
Mas Wan Kuok Koi sempre negou qualquer envolvimento no ataque contra Apolinário. Quando regressava de Portugal em Dezembro de 1996, improvisou mesmo uma conferência de imprensa no aeroporto, para protestar publicamente a sua inocência.
Versão diferente também da defendida por Manuel Apolinário foi apresentada logo após o atentado pelo website Intelligence Online, especializado em informação e contra-informação. Dizia o seguinte: “Pensou-se inicialmente que o ataque armado contra Apolinário foi uma retaliação por ter elaborado uma lista negra de chefes de tríades que seriam indesejáveis em Macau. (...) Mas de acordo com fontes da Intelligence Newsletter, a policia está agora a seguir uma pista bem mais preocupante, que conduz directamente à República Popular da China. Para que conste, a pistola usada no ataque era de calibre 7.62, semelhante à que é normalmente usada pelas unidades do Exército Popular de Libertação. E quando investigou a quem pertenceria, acabou por tropeçar em antigos comandos do EPL, que foram recrutados pela seita Grande Círculo, que acredita ser manipulada pelos serviços secretos chineses (Guoanbu)”.
Não há registo de qualquer reacção oficial chinesa a estas alegações, porventura por entender Pequim que eram completamente desprovidas de crédito. Do mesmo modo, ao ser agora confrontado com este texto, Manuel Apolinário não lhe atribuiu grande credibilidade. E assim, doze anos volvidos, uma pergunta continua sem resposta definitiva e concludente: Quem foram afinal os responsáveis pelo ataque?
Exclusivo Macau Closer/PONTO FINAL