18.4.08

Quarteto Brodsky actua no Centro Cultural de Macau no dia 3 de Maio
A arte de esticar a corda

“Para nós um quarteto de cordas é como um laboratório onde dois violinos, uma viola e um violoncelo, e nós os quatro, interminavelmente buscam a alquimia perfeita de som, espírito, dinâmica, harmonia, equilíbrio e felicidade.” Eis como o Quarteto Brodsky, um dos maiores quartetos de cordas do Reino Unido, se apresenta na sua página de Internet. Fugindo ao estereótipo do quarteto de cordas, este ensemble é reconhecido pelas colaborações com músicos rock, pop e jazz, e também pelos trabalhos encomendados a compositores contemporâneos e projectos aventurosos, como tocar o 15o Quarteto para Cordas de Shostakovich lado a lado com actores da Companhia de Teatro Complicite. As incursões pelo universo pop deram-lhe a reputação de ser um quarteto de cruzamento de estilos, mas no concerto do Centro Cultural de Macau marcado para dia 3 de Maio, os “Brodskys” vão aparecer no seu modo estritamente classico-contemporâneo, isto é, num formato mais ou menos “Brodskista”...
O Quarteto Brodsky deu os seus primeiros passos na Universidade de Manchester no fim dos anos 70, adoptando o nome do violinista russo Adolf Brodsky, que desempenhou um papel importante na vida musical de Manchester. Desde que se fundou em 1972, o ensemble já mudou de primeiro violinista por duas vezes. A primeira foi quando o irmão da violoncelista foi substituído por Andrew Haveron, e a segunda foi em 2007, quando este deixou o quarteto, dando lugar a Daniel Rowland. Outro curioso “assunto de família” é o facto de dois membros do grupo serem casados. Jacqueline Thomas (violoncelo) e Paul Cassidy (viola) têm de manter o equilíbrio entre as suas vidas pessoais e profissionais o que por vezes, Jacqueline admite, é algo que lhes pesa na consciência. “É muito difícil em termos de culpabilidade, porque sentimo-nos mal de deixar as crianças sem nenhum de nós”.

Elvis Costello, Björk, e um Beethoven
que lembra Reggae

Entretanto, o quarteto continua a gerar mais e mais rebentos musicais, colocando no mercado diversos álbuns que foram laureados com vários prémios. Esta discografia cobre o repertório clássico para quarteto de cordas - Haydn, Beethoven, Schubert, Tchaikovsky, Shostakovich, Bartók, Britten e Respighi –mas também foca música clássica contemporânea, concretamente a de compositores como John Tavener, Lutoslawski, Peter Sculthorpe, a estrela do jazz britânico Django Bates, Sally Beamish, Dave Brubeck ou Julian Nott. E depois, há esse lado de cruzamento de estilos dos Brodskys, onde os quatro enveredam pelo desconhecido, explorando um universo que nenhum outro quarteto - para além do Quarteto Kronos - alguma vez ousou explorar: a pop.
Dentro deste mercado de massas, o quarteto é muito respeitado pelo trabalho que fez com os cantores Elvis Costello e Björk. “Colaborar com músicos e compositores de origens e géneros musicais distintos tem-nos dado uma riqueza de oportunidades para experimentar e criar música que um quarteto de cordas tradicional nem sonharia com”, garantem. Os Brodskys trabalharam com Costello pela primeira vez em 1993, lançando o álbum The Juliet Letters. “Foi ao escutar o The Juliet Letters e ao ver-nos a tocá-lo ao vivo que a Björk nos contactou para fazermos os arranjos de cordas para a sua música Hyperballad (…). O próximo passo foi juntarmo-nos a ela na sua digressão pelo Reino Unido”. A super estrela mezzo-soprano Anne Sofie von Otter é outro dos nomes sonantes que figuram na lista de parcerias dos Brodskys. “Trabalhar com a Anne Sofie von Otter foi outra forma de explorar e aumentar a bonita combinação entre quarteto de cordas e voz, para a qual existe tão pouco repertório”.
O projecto Opus 18 também é outro feito que ficará para a posteridade. O ensemble “comissionou seis compositores contemporâneos para darem um comentário musical contemporâneo”, escrevendo novas peças baseadas ou inspiradas em um dos seis quartetos Opus 18 de Beethoven. Uma destas – o Quarteto para Cordas no. 2 de Tunde Jegede – vai ser apresentado no concerto do CCM, e pela primeira vez em Macau. Tunde Jegede é um compositor multifacetado que trabalha com diferentes géneros musicais quer como intérprete (violoncelo, kora, piano e percussão) quer como produtor. O compositor de 36 anos revelou uma vez que tinha primeiro analisado o Op. 18 No. 2 de Beethoven antes de o traduzir para o seu contexto sonoro actual, que funde elementos da música clássica com “world music”. “Quando Beethoven pensa em valsa, eu ouço reggae, quando ele usa intensidade rítmica com semi-colcheias em staccato, eu ouço complexas modulações de ritmos africanos.”

Didgeridus, estações de metro e chuva

Multiculturalismo é certamente uma boa palavra para descrever a selecção que o quarteto britânico preparou para o público de Macau. Para além de apresentar um Beethoven “world music”, o programa viaja do México à Austrália. Considerado pela revista Strad como “um dos mais importantes criadores de música para quarteto do séc. XX”, o tasmaniano Peter Sculthorpe tem sido, ao longo de décadas, o compositor australiano mais importante e prolífero. Esse estatuto resultou do seu entusiasmo pela paisagem australiana, e a sua conexão com as canções e cultura aborígene. O seu Quarteto de Cordas no. 11, Sonho Jabiru, também uma estreia em Macau, foi especialmente concebido para o Quarteto Kronos. Adoptando o nome de uma célebre formação rochosa, Sonho Jabiru tem dois típicos padrões rítmicos australianos e uma singular coda “pio de ave”.
Do México, Macau ficará a conhecer peças por dois compositores que são professor e estudante. Mario Lavista, um dos compositores mexicanos mais influentes da actualidade, escreveu Reflejos de la Noche em 1984, inspirando-se em Reflejos, uma colectânea de poemas do poeta e dramaturgo mexicano Xavier Villaurrutia. O seu aluno Javier Alvarez, um dos mais conhecidos compositores mexicanos da sua geração, é o autor de Metro Chabacano (1991), banda sonora para uma grande instalação que o artista plástico Marcos Límenez fez para a Chabacano, uma das mais movimentadas estações de metro da cidade do México. A música transborda de energia rítmica, captando perfeitamente a agitação da estação de metro.
De todas as peças que o Quarteto Brodsky vai tocar em Macau, a mais célebre é provavelmente o Adagio de Quarteto de Cordas, Op. 11, do norte americano Samuel Barber (1936). Curiosamente, esta foi a primeira e única obra para quarteto de cordas que Samuel Barber alguma vez compôs, mas a sua versão reorquestrada tornou-se um êxito, figurando na programação da maioria das orquestras norte americanas e ainda na banda sonora premiada do filme de Oliver Stone “Platoon - Os Bravos do Pelotão”. Também dos Estados Unidos vêm as Duas Peças para Quarteto de Cordas de Aaron Copland, que foram compostas separadamente em 1923 e 1928, e depois fundidas. A última peça do concerto é da autoria do holandês Theo Verbey, que originalmente criou Chuva de Primavera para o Quarteto Brodsky em 2001. A obra procura retratar diferentes formas de chuva, indo de ligeiros aguaceiros a chuvas torrenciais ao estilo de A Sagração da Primavera.
Com este cocktail inebriante de culturas e uma experiência impressionante, o Quarteto Brodsky seguramente irá surpreender aqueles que comparecerem a este concerto organizado pelo Centro Cultural, mostrando que a música clássica tem muito mais que se lhe diga do que apenas os clássicos. Como uma vez afirmou Andrew Haveron, antigo violinista do ensemble, “os últimos quartetos de Beethoven não são as únicas coisas que vale a pena ouvir – existe outra música por aí e que merece com que se persista”.

Centro Cultural de Macau

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