Chris Botti, trompetista do Sting, no Centro Cultural de Macau a 3 de Junho
“Quando tocamos ao vivo,
não se pode contar com nada”
“Quando tocamos ao vivo,
não se pode contar com nada”
O trompetista Chris Botti ainda está perplexo com o facto de o seu último álbum Italia ter competido com The Mix-Up dos Beastie Boys para melhor álbum de pop instrumental nos Grammys do ano passado. De facto, é deveras estranho como o CD do trompetista – uma fusão de jazz, pop e música clássica – esteve frente a frente contra a incursão funk-rock dos pais do Hip Hop branco. No fim, foi The Mix-Up que levou para casa o Grammy, mas Botti também não saiu a perder: “De todas as minhas gravações é a que está a vender melhor o que, nos tempos que correm na indústria discográfica, é um facto que me deixa entusiasmado”.
Na verdade, o trompetista norte americano – que estará em Macau a convite do Centro Cultural no próximo dia 3 de Junho – nunca sabe o que esperar dos Grammys, porque basicamente criou o seu próprio género musical. “Por vezes é difícil perceber o que é que a comissão vai fazer, mas penso que é fantástico o facto de estarmos a competir contra os Beastie Boys... É algo em que não se pensa quando se é um miúdo a crescer em Oregon”.
Criado em Corvallis, Oregon, Estados Unidos, Botti foi empurrado para o mundo da música pela sua mãe, uma professora de piano em “part-time”, primeiro aprendendo a tocar piano e depois adoptando a trompete. Quando se mudou para Nova Iorque ficou “profundamente embrenhado no mundo do jazz”, colaborando com o saxofonista George Coleman e o falecido trompetista-mestre Woody Shaw, a quem pediu lições. Foi aí que percebeu que não estava no seu destino ser um verdadeiro músico de jazz. Começou então a procurar outro caminho musical, tornando-se num músico de estúdio, trabalhando para Bob Dylan e Aretha Franklin. Mas o momento em que verdadeiramente encontrou o seu percurso foi quando escutou o álbum So de Peter Gabriel. “Nessa altura” recorda Botti, “procurei casar as minhas raízes de jazz com aquilo que eu verdadeiramente gostava enquanto adulto – aquela produção world music/anglosaxónica, fosse Sting ou Peter Gabriel ou mesmo algumas coisas que os U2 fazem. Aquela atitude de camadas atmosféricas atraiu-me”.
Sting, o “Boss Man”
Isto levou ao lançamento do seu álbum de estreia em 1995 - First Wish- , e Botti continuou a trabalhar no estúdio e na estrada com grandes nomes como Frank Sinatra, Quincy Jones, Joni Mitchell e também Paul Simon, com quem andou em digressão e em gravações durante cinco anos. O seu grande momento viria, no entanto, com Sting. A colaboração entre ambos data de 1999, altura em que o músico se juntou à banda da estrela pop na qualidade de solista, figurando na digressão “Brand New Day” durante dois anos. “O Sting é o tipo que é unicamente responsável por mostrar o som da minha trompete ao mundo”, reconhece Botti. “Tem aparecido nos meus CDs, DVDs, e tem sido como um familiar para mim. Nunca lhe conseguirei pagar.”
Sting apareceu no segundo CD de Botti, When I Fall In Love, de 2004, que empregava doses generosas de orquestrações sedutoras e recorria aos clássicos do cancioneiro norte americano, e também no álbum de 2005 To Love Again, onde a junção da trompete e voz na faixa “What Are You Doing the Rest of Your Life?” lhes renderam um Grammy para melhores arranjos instrumentais para acompanhamento de vozes.
“O que é singular sobre ele é que ele tem pedaços de jazz e vem do mundo do jazz (...), mas também possui uma sensibilidade pop muito refinada” diz Sting sobre Botti. “Ele tem uma aparência óptima e apresenta-se bem. É trabalhador e, sabe, uma estrela vê-se a quilómetros de distância”. Botti, embora completamente lançado na sua carreira a solo, continua a referir-se a Sting como o “Boss Man”, e os dois continuam grandes amigos. “O Sting é como se fosse o meu irmão malandro. Temos características físicas em comum e praticamos yoga juntos, Ashtanga yoga”.
Kenny G? Música de elevador?
A outra pessoa por detrás do sucesso do trompetista é a rainha da TV norte americana Oprah Winfrey, que possui o poder de transformar desconhecidos em estrelas. Foi apenas depois de Botti aparecer no programa “Oprah” em 2004, por altura do lançamento do seu álbum de baladas When I Fall in Love, que ele verdadeiramente se tornou numa estrela pop, vendendo mais de meio milhão de cópias. Este apadrinhamento da Oprah também deve ser provavelmente a razão pela qual os fãs de Botti são principalmente mulheres. Isto e o facto de ter namorado com Katie Couric, uma actriz da TV norte americana, e de, claro está, ser naturalmente dotado de boas características físicas, tão boas ao ponto de a revista People o ter eleito como uma das “50 Pessoas Mais Bonitas” de 2004.
Os críticos de música e o milieu do jazz provavelmente vêem tudo isto como uma estratégia publicitária que denigre a legitimidade de Botti como um músico por mérito próprio, mas há algo para além da primeira impressão. Os adeptos do jazz que temem a chegada de mais um Kenny G não têm nada a recear do fenómeno Botti. Ao invés de dar uma pincelada geral de jazz ao R&B instrumental, ele é claramente inspirado pelas produções de Miles Davis de meados dos anos sessenta, do quinteto com o saxofonista George Coleman, altura em que o mítico trompetista andava a desconstruir “My Funny Valentine”, “All of You” e “Autumn Leaves”. E, mais relevante ainda, Chris Botti tem sempre se rodeado de alguns dos melhores músicos de jazz.
Não obstante, algumas pessoas ainda catalogam a sua música como “lounge”, ou música de elevador. “É uma coisa estranha lidar com isso,” desabafa Botti. “Quando se entra num restaurante ou num elevador, e se escuta Nora Jones ou Elton John, tudo bem. Mas quando é música instrumental as pessoas dizem logo ‘Oh, não é bom’. A primeira impressão é que é que música instrumental com um sentimento relaxante não é boa. Faz-se um álbum que vende como o de outros músicos, e mesmo assim não nos é dado o mesmo respeito, este apenas acontece quando as pessoas vêem ao concerto ouvir a música em concreto”.
Jazzing it up
O que deve então o público de Macau esperar do concerto “A Sedução do Jazz” do próximo dia 3 de Junho? Para começar, o trompetista garante que os seus espectáculos ao vivo têm muito mais energia jazz do que os seus CDs. "Os espectáculos ao vivo são completamente diferentes dos álbuns, que são todos um pouco etéreos”, clarifica Botti. "Gosto de introduzir algum humor e de subir a carga enérgica, deixando a banda exercitar um pouco os seus músculos musicais”.
De facto, é curioso como todos são rápidos a categorizar Botti como um músico que faz “jazz falso”, mas depois ao vivo a atmosfera jazz está lá. “Caí numa situação complicada, especialmente no caso dos críticos, em que eles rapidamente explicam que não é um álbum de jazz, e eu também rapidamente explico que não é um álbum de jazz. E depois, quando eles vêm ver-nos ao vivo e eu tenho (...) estes músicos de jazz em palco e eles estão a “dar gás”, mostra uma amplitude que acho que as pessoas não estão à espera. Quando tocamos ao vivo, não se pode contar com nada”.
Centro Cultural de Macau