13.5.08

Uma análise de João Paulo Meneses a partir dos sinais dados na inauguração do Museu do Oriente
Cortar com o passado
para pagar uma dívida a Portugal?


João Paulo Meneses
putaoya@hotmail.com

A inauguração do Museu do Oriente foi mais do que – simbolicamente – o primeiro dia de um dos melhores espaços sobre cultura oriental na Europa. Foi o «corte» da Fundação… com o Oriente, situação que se vinha adivinhando nos últimos anos e que teve na passada quinta-feira o momento fulcral.
Foi uma festa essencialmente portuguesa, e a esse nível teria sido difícil a Carlos Monjardino ter conseguido mais: juntou Cavaco Silva, José Sócrates e Jaime Gama na mesma iniciativa e conseguiu afirmar o Museu como uma unanimidade no panorama cultural português. Para fechar o leque, além de vários ministros, também o cardeal-patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, e até o pretendente ao trono real, Duarte Bragança, estiveram presentes.
Já do Oriente, além das peças, apenas os representantes diplomáticos de Macau (Raimundo do Rosário) e da China (o embaixador Gao Kexiang).
As eventuais indisponibilidades de convidados «orientais» para se deslocarem a Lisboa não só não ajudaram à festa que se queria de fusão, como acentuaram esse corte.
De qualquer forma, não se viram por lá representantes do IPOR, por exemplo, ou da delegação da Fundação em Macau – o que deu à festa o tal carácter essencialmente português. Jornalistas, também só de Portugal.

Cavaco também não

Se a comunicação social portuguesa deu – com excepções, como o Expresso, por exemplo – muita atenção ao Museu (mérito, também, da agência de comunicação com que a Fundação trabalha, a LPM, a mais importante a nível nacional), a de Macau como que passou ao lado, uma espécie de «retribuição» por esse corte. Será interessante perceber qual o estado de espírito que irá marcar a próxima deslocação de Carlos Monjardino a Macau e também as explicações que irá dar, assentes mais em factos do que em declarações de intenções (essas foram repetidas à Visão da semana passada, como se pode ler nesta página).
Na opinião de um dos presentes, com quem o PONTO FINAL falou na sexta-feira, a Fundação Oriente é, relativamente a Macau, uma espécie de pecado original. Mas vai ser precisa mais uma geração – aquela que surgir sem conhecer estes 20 anos – para que Fundação Oriente e Macau voltem a «casar».
Curiosamente o discurso de Cavaco Silva como que sublinhou esse corte: nem uma referência a Macau, nem uma referência ao facto de ter sido com o dinheiro de Macau que o Museu foi construído. O Presidente terá querido evitar lembrar «pecados velhos», mas – consciente ou inconscientemente – acabou por sublinhar essa ideia de corte com o passado (o discurso de Cavaco está online, o de Monjardino não, pelo que não nos podemos referir a ele; além do mais, as várias pessoas com quem falámos queixaram-se de que não o conseguiram ouvir, por causa de problemas de som; dos jornais, sabe-se que prestou homenagem a Mário Soares e a Jorge Sampaio, pelo empenho na criação e consolidação da Fundação).

E agora?

João Calvão, o director dos serviços culturais da Fundação, já o tinha revelado no PONTO FINAL há dois anos: mais do que um Museu, o espaço quer ser um Centro Cultural.
Esta designação é, no entanto, apenas para consumo interno. Ainda assim, várias vezes, nestes últimos dias, os seus responsáveis têm dito que não querem limitar o Museu a exposições para serem visitadas, mas querem tornar o espaço vivo, dinâmico e actuante. É um grande desafio, até porque se sabe que estes dois anos serão os mais difíceis ao nível financeiro.
Além do mais o espaço é enorme, com seis pisos (embora um deles, pelo menos, esteja reservado para áreas técnicas e de reservas) e os objectivos passam por atingir cerca de cem mil visitantes até ao fim do ano.

PS – esta análise foi construída a partir de informações, nomeadamente, recolhidas junto de pessoas que estiveram na inauguração; como não fui convidado, não estive presente.


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Menos espaço para a cultura portuguesa em Macau

À Visão da semana passada, Monjardino explicou que «tivemos um papel importante em Macau, que agora será menor. Actualmente, a política do governo macaense é diferente e, para falar francamente, há menos espaço para tudo o que tem a ver com a cultura portuguesa. Avançámos, durante anos, como co-mentores de iniciativas, não podemos manter-nos assim indefinidamente, a substituir o Estado. Seremos fiéis a iniciativas que começámos, mas faremos menos. (…) Esta é a altura para ter mais actividade em Portugal, um salto pelo qual tivemos de fazer escolhas, pois não podemos fazer tudo. A abertura do Museu do Oriente é também um virar de página na Fundação Oriente, que cumpriu deveres fora mas não cumpriu outro dever que tinha em relação a Portugal».

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