Autor do primeiro estudo sobre utilização de Macau como plataforma da China para África lusófona
Investigador duvida
dos resultados práticos do Fórum
Investigador duvida
dos resultados práticos do Fórum
Luís Brites Pereira, o investigador que está a orientar o primeiro estudo sobre os resultados práticos da utilização de Macau como plataforma para os investimentos chineses na África lusófona, considera que a China não precisa de "facilitadores" nas suas investidas no continente, pelo que o Fórum para a Cooperação pode ter um papel secundário.
Em declarações à agência Lusa, o director do Centro para a Globalização e Governação da Universidade Nova de Lisboa afirmou que "não me surpreenderia se esse estudo viesse a revelar que [os chineses] ultrapassam ou não dão o devido papel a esse fórum de Macau".
Para o economista, orador principal no debate sobre "o papel da China no financiamento do desenvolvimento de África" realizado no âmbito da conferência do Banco Mundial sobre desenvolvimento, a decorrer na Cidade do Cabo, África do Sul, os chineses "actuam por interesses bilaterais, país a país".
A ignorância sobre os reflexos - e benefícios para a generalidade da população - da presença crescente da China em África é, considera o economista, extensível aos países lusófonos do continente.
Do mesmo modo, a presença crescente da China na África lusófona, em especial Angola, trará benefícios para Portugal, mas apenas de forma indirecta, por via da capacidade acrescida que aqueles países terão para consumir e investir.
"O benefício [para Portugal] é mais indirecto do que directo. Quando os países de língua portuguesa estão bem vão querer comprar coisas, investir, e isso também é bom para Portugal (…) Penso que os chineses não precisam de facilitadores. Eles têm o dinheiro, têm as necessidades e a capacidade de ir à procura e montar os negócios. Nesse aspecto não têm precisado de Portugal e podem lidar directamente com os países que lhes interessam", considerou.
Quanto aos reflexos da presença chinesa nos países africanos lusófonos, Brites Pereira deu como exemplo o caso angolano, onde a presença chinesa tem maior expressão: para a China "o benefício é evidente" já que Pequim conseguiu reservar para si "25 por cento da produção petrolífera angolana", para Angola "é muito cedo para dizer" se as contrapartidas "estão ou não a ser bem aproveitadas" e se trarão benefícios no médio e longo prazo.
"Se é bom ou mau remete para a questão da governação. Se esta oportunidade - financiamento a baixo custo, taxas de juro favoráveis -, se isso é bem ou mal aproveitado depende muito de quem está a receber e a gerir esse dinheiro. E por isso não há uma resposta fácil. Se, por exemplo, o dinheiro vai para educação, para melhorar a qualificação das pessoas, a prazo revela-se um bom investimento", comentou.
A incógnita sobre Angola é, na opinião de Luís Brites Pereira, é idêntica à de todo o continente - "há poucos estudos feitos sobre a China em África. Neste momento existe pouco conhecimento sobre essa relação, apenas alguns dados de comércio, algumas tendências de investimento e a ajuda. Mas exactamente como esses três elementos estão a entrar na economia e que tipo de impacto estão a ter, isso não é conhecido", disse.
China prefere economias fechadas
O investigador português, autor de um estudo sobre as motivações do investimento chinês em África a ser apresentado hoje na Cidade do Cabo, identificou, no entanto, o "padrão" da estratégia de Pequim no continente.
"A China prefere economias mais fechadas ao comércio para aproveitar oportunidades de negócio e nichos de mercado que não têm sido aproveitados e prefere economias com recursos naturais, especialmente o petróleo (...) No aspecto da ajuda, ela está sempre relacionada com o aspecto das exportações, há uma ligação entre a ajuda e o apoio às empresas exportadoras. Há uma preferência por estabilidade macroeconómica. Depois existe o aspecto de que não prezam muito as instituições e a boa governação", enumerou
De resto, o debate na conferência do Banco Mundial suscitou mais interrogações que certezas: questões sobre o perigo de o dinheiro de Pequim não ser usado para fomentar actividades produtivas e conduzir os países africanos ao sobre-endividamento sem benefício visível para as economias, a emergência de monopólios chineses em alguns países e os entraves que colocam à emergências de novas indústrias locais, as questões da transparência, da corrupção e da marginalização da mão-de-obra local em detrimento de trabalhadores trazidos da China.
Stephen Muyakwa, representante de uma organização da sociedade civil zambiana, deu a receita: "os países preferem lidar com os países individualmente e não tanto com organizações porque isso é benéfico para eles. É preciso uma relação [com Pequim] muito mais ampla. Será muito mais fácil quando a África negociar como um todo e conseguir ter uma posição comum".