12.6.08

Autor do primeiro estudo sobre utilização de Macau como plataforma da China para África lusófona
Investigador duvida
dos resultados práticos do Fórum


Luís Brites Pereira, o investigador que está a orientar o primeiro estudo sobre os resultados práticos da utilização de Macau como plataforma para os investimentos chineses na África lusófona, considera que a China não precisa de "facilitadores" nas suas investidas no continente, pelo que o Fórum para a Cooperação pode ter um papel secundário.
Em declarações à agência Lusa, o director do Centro para a Globalização e Governação da Universidade Nova de Lisboa afirmou que "não me surpreenderia se esse estudo viesse a revelar que [os chineses] ultrapassam ou não dão o devido papel a esse fórum de Macau".
Para o economista, orador principal no debate sobre "o papel da China no financiamento do desenvolvimento de África" realizado no âmbito da conferência do Banco Mundial sobre desenvolvimento, a decorrer na Cidade do Cabo, África do Sul, os chineses "actuam por interesses bilaterais, país a país".
A ignorância sobre os reflexos - e benefícios para a generalidade da população - da presença crescente da China em África é, considera o economista, extensível aos países lusófonos do continente.
Do mesmo modo, a presença crescente da China na África lusófona, em especial Angola, trará benefícios para Portugal, mas apenas de forma indirecta, por via da capacidade acrescida que aqueles países terão para consumir e investir.
"O benefício [para Portugal] é mais indirecto do que directo. Quando os países de língua portuguesa estão bem vão querer comprar coisas, investir, e isso também é bom para Portugal (…) Penso que os chineses não precisam de facilitadores. Eles têm o dinheiro, têm as necessidades e a capacidade de ir à procura e montar os negócios. Nesse aspecto não têm precisado de Portugal e podem lidar directamente com os países que lhes interessam", considerou.
Quanto aos reflexos da presença chinesa nos países africanos lusófonos, Brites Pereira deu como exemplo o caso angolano, onde a presença chinesa tem maior expressão: para a China "o benefício é evidente" já que Pequim conseguiu reservar para si "25 por cento da produção petrolífera angolana", para Angola "é muito cedo para dizer" se as contrapartidas "estão ou não a ser bem aproveitadas" e se trarão benefícios no médio e longo prazo.
"Se é bom ou mau remete para a questão da governação. Se esta oportunidade - financiamento a baixo custo, taxas de juro favoráveis -, se isso é bem ou mal aproveitado depende muito de quem está a receber e a gerir esse dinheiro. E por isso não há uma resposta fácil. Se, por exemplo, o dinheiro vai para educação, para melhorar a qualificação das pessoas, a prazo revela-se um bom investimento", comentou.
A incógnita sobre Angola é, na opinião de Luís Brites Pereira, é idêntica à de todo o continente - "há poucos estudos feitos sobre a China em África. Neste momento existe pouco conhecimento sobre essa relação, apenas alguns dados de comércio, algumas tendências de investimento e a ajuda. Mas exactamente como esses três elementos estão a entrar na economia e que tipo de impacto estão a ter, isso não é conhecido", disse.

China prefere economias fechadas

O investigador português, autor de um estudo sobre as motivações do investimento chinês em África a ser apresentado hoje na Cidade do Cabo, identificou, no entanto, o "padrão" da estratégia de Pequim no continente.
"A China prefere economias mais fechadas ao comércio para aproveitar oportunidades de negócio e nichos de mercado que não têm sido aproveitados e prefere economias com recursos naturais, especialmente o petróleo (...) No aspecto da ajuda, ela está sempre relacionada com o aspecto das exportações, há uma ligação entre a ajuda e o apoio às empresas exportadoras. Há uma preferência por estabilidade macroeconómica. Depois existe o aspecto de que não prezam muito as instituições e a boa governação", enumerou
De resto, o debate na conferência do Banco Mundial suscitou mais interrogações que certezas: questões sobre o perigo de o dinheiro de Pequim não ser usado para fomentar actividades produtivas e conduzir os países africanos ao sobre-endividamento sem benefício visível para as economias, a emergência de monopólios chineses em alguns países e os entraves que colocam à emergências de novas indústrias locais, as questões da transparência, da corrupção e da marginalização da mão-de-obra local em detrimento de trabalhadores trazidos da China.
Stephen Muyakwa, representante de uma organização da sociedade civil zambiana, deu a receita: "os países preferem lidar com os países individualmente e não tanto com organizações porque isso é benéfico para eles. É preciso uma relação [com Pequim] muito mais ampla. Será muito mais fácil quando a África negociar como um todo e conseguir ter uma posição comum".

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