16.6.08

A Católica há 30 anos em Macau

A Universidade Católica Portuguesa é a instituição que mantém com Macau uma relação mais estável e duradoura; uma relação que, 30 anos depois, está ainda mais forte

João Paulo Meneses
putaoya@hotmail.com

Em Junho de 1978 o governo de Macau e a Universidade Católica (UCP) assinaram um acordo para que os alunos do Território pudessem ir estudar para Lisboa, evitando assim que tivessem que o fazer em Hong Kong ou Filipinas, por exemplo.
Mas este acordo – de que agora se assinalam 30 anos – é/foi muito mais do que isso. Esse acordo é a ligação mais perene e duradoura entre Macau e uma instituição de Portugal.
Significa isto que, provavelmente sem terem essa noção, os elementos do governo de Garcia Leandro e os responsáveis da Católica em Lisboa estavam a fazer história quando nesse dia 13 de Junho de 1978 juntaram as suas assinaturas num documento que acabou por ter diversos desenvolvimentos (efeméride assinalada na Cronologia da História de Macau, organizada por Beatriz Basto da Silva).
Provavelmente antes da Católica assinar este acordo terá havido outras instituições portuguesas com os olhos postos em Macau, mesmo ao nível formal. Mas se o fizeram, as suas intenções não passaram à história. Nenhuma outra instituição se manteve tanto tempo, e desde tempos tão antigos, ligada a Macau, sendo que o presente é hoje muito mais rico ao nível de empenho e realizações do que o passado, o que significa uma relação que não perdeu o fulgor.
E não será por acaso que se trata de uma instituição de raiz religiosa a protagonizar esse feito. Ao PONTO FINAL o actual reitor da Católica, Manuel Braga da Cruz, lembra que «Macau sempre esteve no pensamento dos fundadores da UCP. O primeiro Reitor, Prof. Bacelar e Oliveira s.j. [jesuíta] sonhava com a restauração da gloriosa tradição jesuítica do Colégio de S. Paulo, primeira Universidade do Oriente»

Acordo deu estabilidade

O acordo foi assinado, do lado de Macau, pelo secretário-adjunto dos Assuntos Sociais e Cultura, Oliveira Santos, a pedido do então governador Garcia Leandro. Do lado de Macau, interveio o próprio reitor, já referido por Braga da Cruz, Bacelar e Oliveira, mas as negociações terão sido dirigidas pelo então director da Faculdade de Ciências Humanas, Mário Pinto.
Com esse acordo, Macau e os seus alunos que concluíam o ensino secundário garantiam 20 vagas anuais em cinco cursos da Católica.
Garcia Leandro lembra ao PONTO FINAL que o protocolo surge porque, logo após da Revolução de 1974, se vivia uma situação de grande instabilidade, que impossibilitava o envio de estudantes de Macau para Lisboa, de uma forma organizada. O então Governador lembra-se de que chegaram a enviar estudantes para Hong Kong e para Manila (o que obrigava ao domínio do inglês, o que nessa altura era muito menos frequente) nos anos mais turbulentos pós-74. «O protocolo com a UCP foi a melhor solução e deu grande estabilidade para o futuro, tendo beneficiado muitos estudantes de Macau», sintetiza, mesmo que o número de vagas nunca tenha sido aproveitado na totalidade.

Desígnio estratégico

«A colaboração com a China é um desígnio estratégico da UCP, pelo passado e pelo futuro. Por isso criámos o IIUM, como ponte para essa colaboração, que não pretende confinar-se a Macau. Assinámos por isso um Protocolo com a Universidade Sun-Yat-Sen há alguns anos», diz o reitor Braga da Cruz, referindo-se à universidade de Cantão, com que o Instituto Inter-Universitário de Macau (IIUM) tem uma relevante ligação.
As duas instituições criaram – ou estão a criar – um Instituto de Estudos Transculturais Macau-Zhuhai, depois de ter sido criada uma cadeira de português no «campus» de Zhuhai desta Universidade chinesa. Ainda recentemente foram anunciados mais planos de cooperação entre as duas instituições.
Para além da criação do IIUM, outro momento importante desta ligação entre a Católica e Macau foi o aparecimento, recentemente, de um curso internacional de Estudos de Cristianismo em Macau, em língua inglesa neste mesmo Instituto. Braga da Cruz lembra que responderam «a um desafio que nos foi feito pelas autoridades [chinesas] para voltar a fazer a formação do clero do Extremo Oriente, criámos um curso internacional de Estudos de Cristianismo em Macau, em língua inglesa, com alunos provenientes de várias paragens, desde Goa ao Vietname, com professores vindos de toda a parte, desde a Austrália até à Europa, passando pela China. Pude visitar o Seminário de S. José em Novembro passado e ver, comovidamente, a tradição a ser recuperada».
Recorde-se que este curso poderá vir a contar com alunos recrutados na própria China (e, muito provavelmente, ligados à Igreja Patriótica) e que, segundo foi noticiado, as autoridades de Macau demoraram duas semanas a aprovar o plano de estudos (sendo que, numa matéria tão delicada como esta, nunca o fariam sem um sinal concordante da RPC). A Faculdade de Teologia da UCP é a responsável por este curso de Estudos de Cristianismo em Macau.

A instituição católica
com melhores ligações à China

Não admira, assim, que o reitor da UCP classifique muito positivas as relações entre a instituição que dirige e a RPC: «Temos encontrado a melhor receptividade junto das autoridades chinesas e de Macau, e o maior desejo de incentivar a cooperação com Portugal e a Europa, bem como com a Universidade Católica e a Igreja portuguesa, a que procuramos responder com a maior amizade e respeito». Braga da Cruz não quer confirmar – apesar de desafiado pelo PONTO FINAL – que a sua Universidade seja a instituição católica com melhores ligações à China, sabendo-se das relações difíceis entre Pequim e o Vaticano, mas acrescenta que «o ensino de matérias teológicas em Macau tem a autorização do Vaticano, que está empenhado na melhoria das relações com a China». E, de alguma forma, a instituição portuguesa é uma espécie de embaixadora privilegiada dessa vontade.
Aproveitando estes 30 anos de cooperação entre a UCP e Macau, questionámos também o reitor da Universidade portuguesa sobre a falta de reciprocidade relativamente às mesmas matérias mas na própria UCP. Ou seja, se o seu envolvimento na China e em Macau é significativo, já o mesmo não se passa quanto aos assuntos chineses nas várias faculdades da Católica em Portugal. Braga da Cruz lembra, contudo, que «estamos actualmente a ensinar língua e cultura chinesa no Instituto de Estudos Orientais em Sintra, e que o número de alunos tem vindo a aumentar».

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