27.1.08

FIGUEIREDO DIAS DEU AULA AOS DEPUTADOS SOBRE CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Revisão sim, reforma não

Numa altura em que a AL prepara a revisão do Código de Processo Penal, o autor do diploma falou aos deputados. Figueiredo Dias pediu prudência nas alterações e defendeu o fim da fase de instrução

Sónia Nunes

O Código de Processo Penal (CPP) de Macau tornou-se “um sinal seguro de civilização e de humanidade” e uma reforma ao diploma é desnecessária. O que não quer dizer que uma actualização não faça sentido. A avaliação foi feita pelo autor do projecto do CPP da RAEM, que data a 1996 e está a ser revisto pela Assembleia Legislativa. Figueiredo Dias abriu ontem as Primeiras Jornadas de Direito e Cidadania da AL e deixou conselhos aos deputados que ajudaram a compor o auditório juntamente com vários advogados: a fase de instrução deve desaparecer, o Ministério Público deve poder pôr fim a um processo quando entender que a acusação não tem fundamento e a lei caminhar para a internacionalização.
“As linhas gerais do CPP de Macau revelam capacidade para subsistir nos tempos vindouros; uma reforma, salvo porventura a fase de instrução, não se me afigura nem necessária, nem conveniente”, observou o professor catedrático jubilado da Universidade de Coimbra e docente visitante da UMAC, Jorge Figueiredo Dias. O pai do regime processual penal da região entende que a fase intermediária entre o inquérito e o julgamento deve ser eliminada como fase processual penal autónoma. “Tanto em Macau como em Portugal, essa fase vai desaparecer. Os advogados fazem-me a cama por dizer isto, mas vai desaparecer”, brincou o académico.
Já num tom mais sério, Figueiredo Dias esclareceu que a instrução, tal como é hoje conduzida, deve ser substituída pela “comprovação de um Juiz de Liberdades” da decisão do Ministério Público “de deduzir a acusação ou de arquivar o inquérito”. A fase processual que permite que quer o arguido quer os ofendidos possam requerer diligências de prova – com vista a avaliar se há ou não indícios de crime – foi “desvirtuada em direcção a um simulacro de julgamento, antecipado e provisório, inadmissível à luz dos princípios gerais”, justificou.
No final da palestra, Figueiredo Dias foi confrontado com uma pergunta da bancada. A questão referia-se ao facto de o julgamento poder continuar mesmo que o Ministério Público entenda, já em fase de audiência, que não há provas que sustentem a acusação. “Se o MP entender pedir a absolvição, devia fazer mais do que pedir. Devia pôr fim ao processo e usar mais do seu pedido, sobretudo quando não concorda com a decisão do juiz”, observou o professor. E ia continuar a resposta com “devia ser mais frequente” mas logo corrigiu para “nunca aconteceu que o MP tenha interposto um recurso em favor do arguido”.
Figueiredo Dias reiterou que os futuros níveis de criminalidade serão bem tutelados com o actual modelo do CPP, mas não se esquiva a actualizações. Os juristas têm, defende, de debater os métodos de investigação – os critérios de validade da prova nas gravações de voz e imagem, por exemplo – e caminhar no sentido de regras internacionais comuns na esfera do processo penal. A aproximação seria útil, de resto, nos casos de terrorismo ou de crime organizado por permitir a “partilha entre as autoridades judiciárias e policiais dos vários Estados de dados pessoais de suspeitos, acusados e condenados”, equipas conjuntas de investigação ou o “confisco de produtos e instrumentos do crime”, exemplificou o professor.
Figueiredo Dias começou o discurso com uma longa distinção entre reforma e revisão de um código de direito. Aos deputados que preparam alterações ao CPP expressou “uma dupla e séria reserva”: “O legislador deve resistir à tentação de tornar a legislação penal em forma de governo da sociedade” e não deve fazer introduções que mudem a base do código em vigor. Isso seria já uma “reforma encapotada” que pode levar à inconstitucionalidade, alertou.

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