6.1.08

1452 Série III Ano XVI

MACAU/DELTA

CUI ZHIYUAN, AUTOR DE "DEMOCRACIA SUSTENTÁVEL", SOBRE SUFRÁGIO UNIVERSAL EM MACAU
"2019 não é demasiado cedo "

"A meta final é alargar o sufrágio universal na China, portanto não me parece que 2019 seja uma data prematura para Macau eleger directamente o seu Chefe do Executivo ". Cui Zhiyuan, um dos autores de Democracia Sustentável e professor na escola de política e administração pública da Universidade de Tsinghua, em Pequim, foi apanhado de surpresa pelas perguntas das jornalistas de Macau. Não sabia que havia sido proposta uma eleição directa do Chefe do Executivo pela Associação Novo Macau Democrático, mas rapidamente se pronunciou sobre o caso, falando sobre o avanço de uma China democrática. Um caso que tanto anda a encher as páginas dos jornais de Macau parece ainda não ter chegado aos corredores académicos de Pequim. Zhiyuan não hesitou, porém, em falar de sufrágio universal na China como um objectivo político a longo prazo. De facto, a presidência de Hu Jintao parece ser favorável à eleição directa, já que Hong Kong escolherá o seu Chefe do Executivo em 2017, como foi anunciado recentemente.
Em Macau, os tempos ainda são de expectativa, com a entrega da proposta do Associação Novo Macau Democrático (ANMD), no passado dia 2, ao Governo. O documento sugere o ano de 2019 para eleger directamente o Chefe do Executivo, contrariando o processo actual de eleição pela Comissão Eleitoral, composta por 300 membros de vários sectores da sociedade de Macau, e nomeado pelo Governo Popular Central. Já no passado dia 20, a ANMD promoveu uma manifestação pacífica sob o lema "Marchar pela democracia", onde cerca de duas mil pessoas exigiam reformas democráticas na RAEM. A Associação aguarda agora uma resposta do Governo, esperando dentro de dez dias ver iniciado o processo de consulta à população sobre as reformas propostas.
Num auditório pouco composto do Instituto Inter-Universitário de Macau, Zhiyuan discursou sobre a política de distribuição do Partido Comunista Chinês (PCC) e admitiu que o processo de sufrágio universal na China deve ser gradual, concordando com o que parece ser a política central. A verdade é que as aldeias rurais chinesas têm o direito de escolher directamente um comité, que defenda os seus interesses junto do partido, há dez anos.
É a "democracia com características chinesas" de que Jintao voltou a falar no último Congresso do PCC, em Outubro. Ou a "sociedade harmoniosa" chinesa, que passa pela redução das desigualdades sociais, e que o presidente da RPC vem prometendo desde que tomou posse, em 2003.
"A democracia que o presidente Hu Jintao tanto referiu no 17º Congresso do PCC passa pela igualdade de oportunidades entre os chineses. Não é a forma da democracia que interessa realmente, mas o seu conteúdo".

Ensinar a pescar

Hu Jintao abriu o Congresso com um discurso de duas horas e meia focado no desenvolvimento económico, em detrimento de crescimento económico. Apetrechar o interior rural, e não só o litoral. "Eu acho que isso é a conclusão mais significativa do Congresso: privilegiar a igualdade e não só a eficiência. Um conceito não pode ser substituto do outro. Temos de ter as duas coisas, porque a longo prazo a igualdade gerará mais eficiência", explicou Zhiyuan.
O académico preferiu não enumerar as dificuldades que o partido enfrentará para uniformizar as oportunidades dos chineses. Em vez disso, exemplificou o conceito de distribuição com a formação de cooperativas de trabalhadores e agricultores portugueses aquando o Processo Revolucionário em Curso, entre 1974 e 1975. E acabou por voltar às intenções de Jintao, falando na isenção de pagamento de impostos dos agricultores chineses e na nova lei de mediação de processos laborais, que será posta em prática no próximo dia 1 de Maio. Para além de reduzir os custos de abertura de um processo que o trabalhador queira interpor, a nova lei também aumenta o prazo de início do procedimento. A mediação passará a ser gratuita.
"A igualdade de recursos na área da educação é também uma prioridade", explica Zhiyuan, acrescentando que a política de redistribuição das benesses do crescimento económico de um país pelos mais desfavorecidos não é uma novidade. "Todos os países tentam melhorar a assistência social oferecida. A inovação aqui prende-se com a distribuição primária". O objectivo citado por Jintao, e evocado por Zhiyuan, será não só de dar o peixe, mas também ensinar a pescar promovendo o emprego, o empreendimento e a educação a quem tem menos rendimentos.


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ANMD QUER RONDA DE ENCONTROS
Cara-a-cara com os secretários

A Associação Novo Macau Democrático (ANMD) quer realizar uma ronda de encontros a partir de 11 de Janeiro com os cinco secretários, durante a qual espera confrontar os governantes com as políticas que a associação delineou no sentido da reforma democrática, ao mesmo tempo que pretendem dar conta dos anseios da população.
Ontem, a ANMD, que na passada quarta-feira havia dado um prazo de 10 dias para que o Chefe do Executivo iniciasse o processo de auscultação da população sobre as reformas democráticas, enviou para os gabinetes dos cinco secretários do Governo pedidos para a marcação de reuniões.
Segundo sustenta a ANMD, "milhares de pessoas manifestaram-se no Dia de Macau de forma pacífica contra a corrupção, pela democracia e por melhores condições de vida", pelo que se espera da parte do Executivo "uma resposta a essas reivindicações".
Cara-a-cara com os governantes, a ANMD pretende proporcionar uma reflexão sobre o sufrágio directo e universal do Chefe do Executivo e de todos os deputados à Assembleia Legislativa". Outros tópicos, caso os encontros se venham a realizar, incluem os direitos e garantias dos trabalhadores, a protecção do Património da Humanidade, planeamento urbano e o direito às manifestações.


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DEPUTADO CONTRA INSTABILIDADE NOS VÍNCULOS LABORAIS
Pereira Coutinho quer menos contratos a prazo na AP

Pereira Coutinho quer que o Governo "evite recorrer frequentemente ao contrato de trabalho a prazo, ou a contratos de tarefa, contrato de prestação de serviços, contrato de aquisição de serviços", legislando no sentido de "garantir a estabilidade do vínculo contratual entre o trabalhador e os serviços". Em última instância, defende o deputado, "isso permite, quer do lado do trabalhador, quer do lado da entidade contratante, uma melhor prestação dos serviços".
Na sua primeira interpelação de 2008, Pereira Coutinho quer saber "quando vai o Governo uniformizar a forma geral de contratação de trabalhadores nos serviços e entidades públicas quando estes pretendam contratar trabalhadores para execução de trabalhos de longa duração, incluindo o direito fundamental dos trabalhadores terem assistência médica e medicamentosa, bem como as demais regalias que assistem à maioria dos trabalhadores".
O deputado considera abusivo que "alguns serviços públicos e entidades autónomas criem situações em que o trabalho efectivamente prestado corresponde em termos de categoria a 'falsos tarefeiros', celebrando, com os trabalhadores, contratos impróprios".
Além de estes trabalhadores serem prejudicados ao não poderem inscrever-se no Regime de Previdência, "não têm direito às demais regalias que os seus colegas usufruem e que executam pelo mesmo tipo de trabalhos, violando frontalmente o princípio 'para o mesmo trabalho, o mesmo salário'."
Num cenário de "acelerado desenvolvimento económico", no qual "a riqueza não está a ser gerida de forma justa, originando mal estar nos diferentes estratos sociais", o deputado advoga que "o grande desafio da Administração Pública de Macau prende-se com a sua capacidade de resposta às solicitações dos diferentes quadrantes da sociedade".
Esse objectivo, no seu entendimento, só será atingido quando houver "uma mudança de cultura organizativa, virada para um modelo de objectivos concretos, previamente delineados de forma democrática e transparente no início de cada ano civil, e destinados a atingir resultados precisos."
Nesse sentido, o também presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública de Macau quer "estabilidade dos recursos humanos".
Entre as medidas que gostaria de ver aplicadas contam-se "a contínua simplificação dos procedimentos administrativos, informatização dos serviços - por forma a atingir maior transparência dos actos administrativos -, e a assumpção de responsabilidades por cada um dos intervenientes do procedimento administrativo, sobretudo pelos detentores de cargos políticos, (Secretários) dirigentes, e pelas chefias dos serviços."
O deputado vai mais longe e afirma que "a eficácia só pode ser obtida quando for eliminada a excessiva centralização de poderes".


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CHAN MENG KAM E UNG CHOI KUN APRESENTARAM PROPOSTA
Deputados querem rever lei da droga

Chan Meng Kam e Ung Choi Kun elaboraram uma proposta de revisão do Decreto-Lei nº 5/91/M, de 28 de Janeiro de 1991, que "criminaliza actos de tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas e promove medidas de combate à toxicodependência", sendo que os deputados sugerem também que se altere o nome para "Lei Anti-Droga". Em declarações ao jornal Ou Mun, Ung Choi Kun afirmou que a proposta de revisão foi entregue a Susana Chou, presidente da Assembleia Legislativa, a 4 de Dezembro do ano passado.
Para os deputados, o Decreto-Lei não é claro quanto à definição de "quantidades diminutas", e com esta iniciativa - a primeira do género para ambos -, esperam lançar o debate em torno de um Decreto-Lei com 16 anos que, na sua opinião, carece de revisão, apesar das sucessivas emendas que foram sendo feitas ao longo do tempo.
Os pontos que merecem revisão, na opinião dos deputados, são os artigos 8º (Tráfico e actividades ilícitas) e 9º (Tráfico de quantidades diminutas). Uma vez que o artigo 8º prevê uma "pena mais pesada" que o artigo 9º, Ug Choi Kun defende que nos processos judiciais os advogados de arguidos acusados daqueles crimes tendem sempre a preferir a que aos seus constituintes seja aplicado o artigo 9º, sendo que a definição de "quantidades diminutas" não é objectiva, afirma o deputado.
A definição de "quantidade diminuta", segundo o Decreto-Lei é a seguinte: "(...) é a que não excede o necessário para o consumo individual durante três dias, reportando-se à quantidade total das substâncias ou preparados encontrados na disponibilidade do agente." Acrescenta-se ainda que "ouvidos os Serviços de Saúde, o Governador, mediante decreto-lei, poderá concretizar, para cada uma das substâncias e produtos mais correntes no tráfico, a quantidade diminuta (...)".
Contudo, argumenta Ung Choi Kun, o Governo ainda não definiu critérios objectivos, situação que leva os tribunais a decidirem quais são as "quantidades diminutas" para cada substância com "base na experiência".


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PERSONALIDADE DO ANO
Pansy Ho: A herdeira

2007 foi o ano da afirmação definitiva de Pansy Ho Chiu-king no mundo dos casinos e da alta finança. A abertura do MGM Grand Macau, no final do ano, permitiu-lhe tornar-se uma operadora de jogo por direito próprio, ao mesmo tempo que reforçou a sua imagem como provável sucessora de Stanley Ho à frente dos negócios da família. Pelo meio teve que se haver com a desconfiança dos reguladores norte-americanos e com a crescente concorrência em Macau nos sectores a que está há mais tempo ligada – os transportes marítimos e as convenções. Mas os bons resultados do novo resort nos primeiros dias de operação, últimos do ano, abrem perspectivas optimistas para o futuro da parceria que estabeleceu com a MGM. A revista Fortune já a considerou no ano passado a 36ª mulher mais poderosa do mundo. A ascensão não deve ficar por aqui.
O principal desafio que se levantava no ano que agora terminou era a investigação que os reguladores norte-americanos do sector do jogo tinham em curso sobre a sua idoneidade. O procedimento, em si mesmo, é rotineiro, pois todas as empresas que detêm casinos nos Estados Unidos são obrigadas a demonstrar que os seus parceiros de negócios, dentro e fora do país, operam nos estritos limites da lei. Mas no caso de Pansy Ho, as alegações recorrentes de que o seu pai manteria ligações com as tríades, tornaram o processo mais moroso e de desfecho menos previsível. A apenas dois dias da Comissão do Jogo do Estado do Nevada tomar a sua decisão, o relatório de uma investigação efectuada à família Ho – que se soube mais tarde ter sido encomendada pela Las Vegas Sands, rival da MGM em Las Vegas e agora também em Macau – foi parar ao website de um grupo de pressão anti-jogo, de inspiração religiosa, e o seu conteúdo amplamente difundido pela imprensa norte-americana. O relatório reproduzia acusações antigas contra Stanley Ho e alegava que Pansy não era independente do pai enquanto mulher de negócios.
Apesar disso, a Comissão do Jogo do Nevada decidiu por unanimidade aprovar a parceria entre a MGM e Pansy Ho, em Março do ano passado. “Não vi nada que possa trazer descrédito ao estado do Nevada”, resumiu o comissário Arthur Marshall quando revelava o teor da decisão. Para Pansy Ho, foi a primeira grande vitória do ano, e a empresária de 45 anos não escondeu o seu alívio ao afirmar que a decisão “permitiu mostrar que Macau está limpo e que é possível começar a operação sem problemas”.
Continua, no entanto, por se pronunciar a Divisão do Jogo de Nova Jérsia, o outro estado norte-americano onde a MGM opera casinos. Aparentemente, o atraso na divulgação da decisão está relacionado com o facto do relatório elaborado pelos seus investigadores ter muito em comum com o que foi parar às páginas dos jornais, o que nada tem de estranho desde que se soube que reguladores de Nova Jérsia estiveram envolvidos em ambas as investigações. Corre neste momento um inquérito no seio da comissão, a mando da Procuradora-Geral de Nova Jérsia, para apurar eventuais conflitos de interesses.
Se os dois relatórios têm coincidências de autores e conteúdo, dir-se-ia que 2008 poderá começar para Pansy Ho e a MGM com a má notícia de que a sua parceria não tem luz verde na segunda zona de jogo mais importante nos Estados Unidos. Mas a MGM está ainda assim confiante de que a decisão final será de aprovação. Depois de ter afirmado que a companhia “tem orgulho em ter Pansy Ho como parceira”, o presidente da MGM, Terri Lanni, garantiu “não ter preocupações” sobre o relatório final, mostrando-se convicto de que o documento concluirá que “a parceria é digna de ser aprovada”. Ao mesmo tempo, reforçou essa confiança com a promessa de que ao casino Borgata a MGM poderá juntar um outro em Atlantic City, que pelo montante do investimento previsto (cerca de 5 milhões de dólares) poderá mesmo tornar-se o hotel-casino mais caro da história.
No primeiro semestre de 2007, além das preocupações resultantes das audições no Nevada e da construção no NAPE do MGM Grand, Pansy Ho foi-se preparando também para o impacto que a abertura do Venetian, no Cotai, teria no sector das convenções. Começou por surgir na imprensa, com invulgar frequência, a criticar os operadores americanos que a precederam no mercado do jogo por não cumprirem as promessas de diversificação feitas durante o concurso para atribuição de concessões, em 2002 – ao mesmo tempo que chamava a si o mérito por ter avançado com as primeiras apostas significativas com vista ao desenvolvimento dos mercados de convenções e do comércio a retalho.
Depois da inauguração do Venetian, em finais de Agosto, o discurso perdeu algum sentido e a necessidade de encontrar respostas tornou-se mais premente. Nos últimos meses, a Torre de Macau ganhou um dinamismo até aqui desconhecido, ao lado do MGM Grand está já a nascer um grande centro comercial e um novo espaço para convenções, e a joint-venture tem também planos para a construção de um ou dois grandes resorts no Cotai, de características idênticas ao Venetian. Para Pansy Ho, a verdadeira concorrência entre operadores de jogo só agora está a começar.
Já no final do ano, a abertura de um terminal marítimo provisório na zona do Pac On, que seria operado apenas por companhias de navegação ligadas à Las Vegas Sands, proprietária do Venetian, ou ao empresário Ng Fok, também com interesses no jogo, levaram Pansy Ho a criticar abertamente o governo por ter ignorado a Shun Tak. “Nunca recebemos qualquer informação sobre o que se estava a passar”, desabafou numa conferência de imprensa. “Apenas recebemos convites para a inauguração”.
O litígio foi entretanto encaminhado para os tribunais, mas foi pelas intervenções de Pansy Ho que o tema ganhou maior notoriedade em termos públicos. Decidida que foi a liberalização do mercado, Pansy Ho reclama agora tratamento igual para todos os operadores. “Se era para entregar tudo a uns, então mais valia manter-se o monopólio”, queixou-se aos jornalistas.
Stanley Ho mal precisou de intervir no assunto. Na família há agora outra voz a fazer-se ouvir. Alto e bom som.


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ACONTECIMENTO DO ANO
O julgamento que ninguém imaginou possível

Nos dias e semanas que aí vêm, políticos, magistrados, jornalistas e cidadãos em geral vão continuar a aguardar pacientemente a decisão do Tribunal de Última Instância de Macau sobre o processo Ao Man Long, ex-secretário para as Obras Públicas e Transportes que se vê hoje na posição de réu em dezenas de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, enriquecimento ilegítimo não declarado e abuso de poder. Apesar de se tratar do processo desta natureza mais significativo em toda a história de Macau, a expectativa da generalidade dos observadores é atenuada pela forte convicção de que o essencial do veredicto não oferece dúvidas. O que está verdadeiramente em causa, dizem, são as consequências pessoais daí resultantes para o ex-governante, ou até as de natureza institucional que mais cedo ou mais tarde acabarão por afectar o próprio sistema político da RAEM.
Ao longo do julgamento, recorde-se, foram postas em causa práticas administrativas susceptíveis de facilitar a corrupção, mas que têm sido seguidas de forma mais ou menos pacífica em nome da eficiência da máquina governativa – e foi também questionada a acção das entidades fiscalizadoras, a ponto de ter dado entrada na Assembleia Legislativa uma petição que visa uma melhor demarcação dos poderes – e, em última análise, o próprio desaparecimento – do órgão que investigou o caso e formulou a respectiva acusação.
Mas qualquer que seja o veredicto, há uma coisa que se tem praticamente como certa: é que será uma decisão final, dado entender o Tribunal de Última Instância que as suas decisões jamais podem ser objecto de recurso. São caso encerrado, mesmo quando julga em primeira instância – perdoe-se-nos a contradição dos termos.
Também por isso este é um processo que de alguma forma reflecte a realidade recente de Macau, marcada por algum conservadorismo e excessiva prudência no acto governativo. A Lei Básica previu em abstracto que, por uma razão de dignidade, os membros do Governo da RAEM deveriam ser julgados pelo Tribunal de Última Instância, caso fossem acusados da prática de crimes. Dada a forma apressada como foram efectuados os trabalhos da transição, ninguém pareceu muito interessado em saber se havia condições para realizar esse tipo de julgamentos, caso a situação verdadeiramente ocorresse. Daí que na Lei de Bases da Organização Judiciária se tivesse atendido apenas às necessidades imediatas dos Tribunais da RAEM, e se tivesse criado um tribunal de última instância só com três membros. Como todas as decisões deste órgão são tomadas por um colectivo de três juízes, a possibilidade de recurso ficou desde logo excluída.
À falta de reflexão do legislador no período pré-handover juntou-se entretanto a negligência dos órgãos executivo e legislativo da RAEM, que se mantiveram impávidos e serenos mesmo depois de saberem que Ao Man Long seria julgado e que a lei não deixava em aberto qualquer hipótese prática da decisão judicial ser sujeita a uma reapreciação. Com um rápido acerto de posições entre o governo e a Assembleia Legislativa, o problema podia e devia ter sido resolvido por via legislativa. Falhou quem não soube ou não o quis fazer.
Para além da imaturidade assim posta a nu, a RAEM pode ainda rever-se no processo-crime movido contra Ao Ma Long sob outros ângulos. Ele foi o membro do governo que mais trabalho apresentou no exercício das suas funções, dando do Macau pós-handover a imagem de uma cidade dinâmica e aberta ao progresso. Em contrapartida, a fazer fé nos resultados da investigação a que esteve sujeito, foi também quem mais se deixou corromper pelo exercício do poder, manchando de forma decisiva a imagem de uma terra que procurava libertar-se dos estigmas de um passado violento e pouco recomendável.
Como dizia recentemente à revista Macau Closer o professor universitário Bruce Kwong, especialista em Administração Pública, o que mais choca neste caso é “como pôde Ao Man Long agir durante tanto tempo sem qualquer tipo de controlo”, e como é possível que ninguém pareça interessado em saber se houve ou não partilha de responsabilidades com outros membros do executivo. Em suma, um case study que encerra lições preciosas para o futuro.


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Um ano difícil de esquecer

Vai ser difícil esquecer 2007. Nunca, como no ano passado, o nome de Macau foi tão badalado pelos órgãos de comunicação social de todo o Mundo. Depois de se ter oficializado como a nova capital mundial do jogo, deixando para trás Las Vegas, Macau foi notícia pelo pior e pelo melhor.
Vai ser difícil esquecer os tiros disparados por um agente da polícia durante uma manifestação que juntou cerca de 4 mil pessoas no dia 1 de Maio.
Vai ser difícil esquecer as imagens de uma noite em Hac Sa, quando 126 visitantes se revoltaram com guias turísticos que se provou não terem escrúpulos e a polícia em peso tentou evitar confrontos de maior.
Vai ser difícil esquecer que algo vai mal com a preservação e protecção do Farol da Guia, Património da Humanidade que tem merecido a preocupação da sociedade de Macau, da UNESCO e de Pequim.
Vai ser difícil esquecer a decadência do pequeno comércio, que sucumbe face aos especuladores imobiliários ávidos de descaracterizarem certas zonas da cidade transformando-as em nichos de empresas multinacionais.
Mas também vai ser difícil esquecer que 2007 foi o ano em que o Venetian abriu, trazendo com o gigantismo das suas salas de jogo uma oferta que finalmente coloca Macau na rota dos artistas e desportistas mais famosos do planeta.
Ou que se realizou o maior encontro da diáspora macaense, apesar de os filhos da terra terem chegado à conclusão que aquela que um dia deixaram mudou demasiado e que esta, afinal, "já não é a minha Macau."
Vai ser difícil esquecer que os campeões asiáticos de hóquei em patins são outra vez de Macau, e que o território se estreou na Bienal de Veneza, a maior mostra de arte contemporânea do Mundo.
Num ano quase sempre preenchido pelo ruído das grandes manifestações, que consagraram o "motociclista" numa espécie de eminência parda da nossa sociedade, quase que era fácil de esquecer que em 2007 vimos partir em silêncio duas figuras emblemáticas de Macau, o professor Silveira Machado e Chui Tak Kei. Que descansem em paz, e 2007 também.


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CEDEU INFORMAÇÃO PRIVELIGIADA À REVELIA DAS REGRAS
Filho de Edmund Ho suspenso
das actividades de corretor

Justin Ho King-man, filho de Edmund Ho, ex-corretor da JP Morgan Broking, foi banido do sector por quatro meses pela Securities and Futures Comission (SFC) por ter quebrado a regra designada de "Muralha da China". Segundo o South China Morning Post de ontem, a SFC disse que a infracção ocorreu em Março de 2006, quando Ho, de 26 anos, cedeu informação sobre a posição de acções aos seus colegas, sem a autorização do seu supervisor e continuando a recomendar a dita empresa aos seus clientes.
A SFC não nomeou a companhia envolvida no caso, mas fonte próxima do processo explicou que Ho trabalhava na altura com a Kowloon Development, uma empresa com interesses imobiliários em Macau.
A "Muralha da China" proíbe os trabalhadores do sector de trocarem informação com colegas ou com outros departamentos sobre negócios futuros ou presentes, para prevenir o uso de informações internas privilegiadas. A troca de informação privilegiada é ilegal sob a lei de Hong Kong.
O investimento de 1,16 mil milhões de dólares de Hong Kong avançado pela Kowloon Development aconteceu quando a Cazenove Asia estava em processo para ser cotada na bolsa.
A SFC disse que Ho não requereu a sua acreditação depois de largar a JP Morgan em Maio de 2006, pelo que a acção disciplinar significava que ele não poderia candidatar-se a outra licença antes de Abril desse ano.
Ao tomar a decisão, a SFC tomou em consideração que Ho não actuou de forma desonesta nem teve qualquer tipo de beneficio financeiro com a sua conduta, para além de ter um currículo limpo em termos disciplinares e ter admitido abertamente o seu erro.
Segundo a SFC, Ho "não defendeu o melhor interesse dos seus clientes e a integridade do mercado com o cuidado e diligências necessários".
"Embora, não tenha havido negócios baseados nesta informação, se tivesse havido, teriam sido considerados negócios internos ilegais, uma contravenção muito mais grave", explicou Mark Steward, um dos directores da SFC.


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CTM ESPERA "LUZ VERDE" DO GOVERNO
Internet mais barata a partir de Fevereiro

A CTM apresentou uma proposta de redução das tarifas dos serviços de banda larga na casa dos dois dígitos. A confirmação foi dada pelo director executivo da CTM, Vandy Poon.
Em declarações reproduzidas ontem pelo Canal Macau, o responsável disse que a proposta já foi entregue ao Governo, que deverá pronunciar-se nos próximos dias. Se o Executivo for favorável à proposta da empresa, a redução das tarifas pode ser uma realidade já a partir de Fevereiro.
"Espero que tal aconteça nos próximos dias", disse Vandy Poon aos jornalistas, acrescentando que "estou optimista que em Fevereiro seja introduzido este sistema de redução de tarifas."
O executivo pronunciou-se ainda sobre o desempenho da CTM ao longo de 2007, mas deixou para mais tarde a apresentação dos resultados, já que as contas ainda não estão apuradas. Mas Vandy Poon adiantou que o ano passado foi bom para a empresa.
"2007 foi um ano de grandes desafios para a CTM e para as outras operadoras. A economia cresceu muito, e isso trouxe imensas oportunidades. Toda a equipa da CTM trabalhou muito para agarrar essas oportunidades. Foi um ano bom".
Para já sabe-se apenas que a CTM viu, em 2007, aumentar o número de clientes do serviço móvel em 20 por cento face a 2006, a mesma percentagem para o aumento dos clientes do serviço de Internet de banda larga comparativamente ao mesmo período. Já em relação ao serviço de telefone móvel 3G, a CTM conta já com cerca de 30 mil clientes.
Vandy Poon falava aos jornalistas depois da sessão de apresentação de uma parceria entre a CTM e o Banco da China para a criação de serviços bancários através de telefone móvel. O novo acordo vai permitir aos clientes de ambas as empresas de poderem aceder a consultas bancárias e a transacções, entre outros serviços, a partir dos telefones móveis. O novo serviço também vai fornecer informações actualizadas sobre os mercados bolsistas, bem como um sistema de subscrição de acções.


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Instituto Internacional de Macau na CPLP

O Instituto Internacional de Macau foi recentemente distinguido com a atribuição do Estatuto de Observador Consultivo pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), numa decisão do Conselho de Ministros da CPLP, que, de acordo com os seus princípios estatutários, pode atribuir a categoria de Observador Consultivo “às organizações da sociedade civil interessadas nos objectivos prosseguidos pela CPLP, designadamente através do respectivo envolvimento em iniciativas relacionadas com acções específicas no âmbito da Organização”.
A categoria de Observador Consultivo permite às instituições distinguidas assistir às reuniões de carácter técnico e ter acesso às decisões tomadas nas Conferências de Chefes de Estado e de Governo, bem como pelo Conselho de Ministros.
A decisão foi comunicada à Direcção do IIM pelo Secretário Executivo da CPLP, Embaixador José Tadeu Soares, e é tida como reconhecimento da vocação e acção da instituição de Macau na relação com o espaço lusófono, e no âmbito de quarenta protocolos de colaboração estabelecidos com instituições dos países lusófonos durante os últimos anos, com a organização de conferências, exposições, edições, apoios às investigações académicas e intercâmbio de materiais informativos.


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VERSÃO MODERNA DO CLÁSSICO CHINÊS "MARGEM DE ÁGUA" EM CENA NO CCM
Decifrando o homem

“O que é o homem?”, uma peça de teatro moderno co-produzida pelo Teatro Nacional e Sala de Concertos de Taiwan e pelo grupo de teatro e dança de Edward Lam, será apresentada pelo Centro Cultural de Macau no Grande Auditório a 7 de Março pelas 20 horas. Na peça, nove homens e três mulheres aparecem numa audição para um filme de “gangsters”. À medida que tentam entrar na personagem, fazendo sobressair o herói ou vilão que existe dentro deles, acabam por revelar as suas personalidades e, consequentemente, os seus preconceitos em relação à masculinidade.
Nesta peça de teatro, o encenador de Hong Kong Edward Lam e um elenco de Taiwan dão vida a algumas personagens do clássico da literatura chinesa “Margem de Água”, que conta os feitos de uma quadrilha de foragidos que se refugia na montanha Liang. No entanto, em vez de meramente dramatizar a história original, “O que é o homem?” encaixa-a na modernidade, ao mesmo tempo que tenta descortinar a ressonância dos textos originais na sociedade chinesa moderna.
Edward Lam que tem vindo a fazer adaptações modernas de clássicos da literatura desde 2005. Em Setembro de 2006, o director de Hong Kong apresentou “Madame Bovary sou eu”, também no CCM. Esta encenação contemporânea do romance francês do séc. XIX “Madame Bovary” de Gustave Flaubert foi intensamente apreciada pelo público de Macau. Nessa altura, Edward Lam tentou decifrar a mulher ocidental; agora, tenta compreender o homem chinês.
A obra “Margem de Água”, considerada um dos clássicos mais relevantes da literatura chinesa, é um dos mais ricos em termos de caracterização de personagens masculinas. Edward Lam extraiu do romance estes arquétipos do homem-herói, e confrontou-os com a modernidade, inserindo-os numa forte atmosfera contemporânea. Graças a esta contextualização, torna-se possível apreciar a percepção actual da identidade masculina, mas também explorar os vários tipos de opressão a que os homens se submetem na sociedade contemporânea. Antigamente, os foragidos da montanha Liang lidavam com a opressão através da insurreição ou do estabelecimento de compromissos com as autoridades. Nos tempos que correm, como será que os homens modernos reagem às repressões da sociedade? Eis a questão central que “O que é o homem” visa propor ao público que marcar presença na actuação em Macau a 7 de Março.
O espectáculo é em mandarim com legendas em chinês. Os bilhetes variam entre as 80 e as 250 patacas.

(Texto do Centro Cultural de Macau - Editado)

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