7.4.08

Oriente q.b. em Lisboa: especialistas dizem de sua justiça
Dois museus na mesma rua:
dúvidas ou complementaridade?


Entre a Junqueira (CCCM) e Alcântara (MO) são dez minutos a pé. Há quem tenha dúvidas sobre a coexistência mas também há quem fale em complementaridade. O presidente do CCCM não diz nada…

João Paulo Meneses
putaoya@hotmail.com

Com o Museu do Oriente inaugurado, Lisboa passa a ter dois espaços com vocação idêntica, ainda que ambições diferentes, separados por dois ou três de quilómetros. Ainda por cima, o Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) também possui uma vocação de Museu.
Daí que o PONTO FINAL tenha pretendido avaliar a opinião de vários especialistas sobre estas questões, ao mesmo tempo que questionou o presidente do Centro (ver texto nesta página).
Se relativamente à coexistência das duas instituições se dividem as opiniões entre aqueles que aceitaram responder, já sobre a criação do Museu não há ninguém que não aplauda.
Vasconcelos Saldanha por exemplo considera que «a próxima concretização do projecto do Museu do Oriente, da Fundação Oriente, é motivo de regozijo para todos os que em Portugal se preocupam pela manutenção e desenvolvimento das mais variadas facetas do interesse pela Ásia».
O antigo presidente do IPOR elogia aquilo que designa por «apelo ao termo ‘Oriente’» uma vez que isso faz esperar que «o âmbito “geográfico-cultural” ou “geográfico-científico” vá para lá das dimensões reducionistas de um “Museu de Macau” ou “da China”. É tempo de afirmar em Portugal a maioridade de uma aproximação a um “Oriente” global e este projecto suscita uma excelente oportunidade para o fazer. E bom é que ela surja no âmbito do privado já que o público (oficialmente vocacionado e departamentalizado para o fazer) vai acumulando provas sobejas de inabilidade para o pensar, quanto mais para o fazer!».

Elogios e… reticências

António Graça de Abreu, professor de língua e cultura chinesa, entende que «A Fundação Oriente possui um valiosíssimo acervo de peças relacionadas com a China e com o Oriente. Por todas as razões (mais, fundamental, Macau !) se justifica um Museu do Oriente». E Jin Guo Ping vai mais longe, considerando também importante a opção pela ideia do Oriente: «Pela gesta portuguesa no Oriente, Portugal merece um Museu do Oriente de há muito tempo. A FO está de parabéns pela iniciativa».
Menos entusiasmada é a opinião de Arnaldo Gonçalves. O presidente do Fórum Luso-Asiático diz que encara «com agrado, a abertura em Lisboa de um espaço museológico dirigido a consagrar a nossa relação de 440 anos com a China, por via de Macau. O diálogo intercultural Luso-Chinês não é um palavra vã e temos pena que essa oportunidade venha sendo perdida com o afunilamento das prioridades da política externa portuguesa na Europa e pouco mais. Cremos ser essa uma vantagem comparativa que Portugal não tem tirado partido, de forma irresponsável e direi, mesmo, perdulária».
Mas Arnaldo Gonçalves refere que «Fizemos oportunamente sentir, ao governo de Portugal, que o peso do protagonismo da Fundação Oriente, no que às relações oficiais com a China e a Ásia diz respeito, tem sido prejudicial a Portugal já que estreita a nossa capacidade de actuação no Oriente. O país já pagou uma factura elevada pelo protagonismo da Fundação no que respeita às negociações da transição de Macau e à continuidade da presença dos interesses portugueses na China e na Ásia. Portugal não tem uma presença económica, financeira e empresarial condigna na China. A sua acção de promoção e defesa da língua e cultura portuguesas é deficitária, triste, inconsistente. Isso ocorre por uma confusão entre a política externa e cultural do país e a acção de entidades privadas como a Fundação Oriente».

Complementaridade

Quanto à coexistência com o CCCM, o presidente do Fórum Luso-Asiático e investigador considera que «Tem desenvolvido um notável trabalho de divulgação da investigação portuguesa sobre Macau e o Oriente, é a única entidade portuguesa interessada em promover o debate sobre as comunidades macaense e portuguesa residentes na RAEM, desde 1999. E tem-no feito de uma forma digna e independente, acolhendo pessoas com diferente orientação partidária. Motivo que engrandece a sua acção e sugere a sua continuidade». Por isso Arnaldo Gonçalves pensa que «é indispensável e deverá constitui um braço da cooperação externa e cultural do governo português». «Acho que a acção das duas entidades (FO e CCCM) não se confundem nem atrapalham, fazendo a fundação privada o que os seus accionistas entendem e o CCCM pautando-se pelos interesses do país, e pela política cultural definida pelo governo», conclui Arnaldo Gonçalves.
Também Vasconcelos Saldanha fala em coexistência e até em complementaridade: «também nos podemos regozijar que o MO coexista com um pré-existente CCCM, hoje um instituto público, inteiramente sustentado no seu funcionamento por verbas públicas, dotado de simpática logística, de uma excelente biblioteca e de uma interessante colecção de arte. A vocação originária da sua ligação a Macau e à China artística e histórica, e a recente recondução das suas actividades ao contexto da investigação segundo modelos e recursos garantidos pelo Estado, sugerem interessantes hipóteses de complementaridade».

Dois museus na mesma rua

Mas os outros dois especialistas que o PONTO FINAL ouviu não têm as mesmas certezas. Graça de Abreu, por exemplo, pensa que é exagerado estarem os dois espaços na mesma cidade e ainda por cima juntos: «Talvez estejamos perante uma situação em que vale mais a pena a existência de um e não de dois. A proximidade geográfica ali em Alcântara também não ajuda à existência de dois museus. Justificar-se-ia um museu no Porto, por exemplo». Para já, são muitas as dúvidas do poeta, tradutor e um dos primeiros portugueses a viver em Pequim depois de 1974: «O CCCM poderá continuar com o museu e outras actividades? Haverá complementaridade entre o que se faz no CCCM e na Fundação Oriente? Há público para actividades semelhantes nas duas instituições? Tenho sérias dúvidas. Seguirão caminhos paralelos ou cada instituição continuará com rumo próprio?».
Já Jin Guo Ping lembra o espaço museológico que existe no CCCM: «perante a nova situação, o CCCM precisa de novas políticas, sobretudo em relação ao seu Museu». Mas este investigador não tem muitas esperanças: «Dada a actual situação financeira, um pouco difícil, na administração pública, talvez vá continuar como tem estado até agora».

CAIXA
Perguntas sem resposta

Atempadamente o PONTO FINAL enviou um conjunto de perguntas ao presidente do Centro Científico e Cultural de Macau, sobre o futuro e a relação com o Museu do Oriente, mas o actual gestor deste instituto público entende(u) que não deve prestar contas à comunicação social, pelo menos à de Macau, não tendo sido ainda desta que os leitores do PONTO FINAL puderam ficar a saber o que pensa Luís Filipe Barreto.

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