Julgamento conexo ao do antigo secretário para os Transportes e Obras Públicas
Carion reitera ter recebido
instruções de Ao Man Long
Carion reitera ter recebido
instruções de Ao Man Long
Jaime Carion, o director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, e o antigo chefe do departamento das Obras Públicas, já tinham sido inequívocos em processos anteriores ao afirmarem terem recebido instruções de Ao Man Long no âmbito das Obras Públicas para alterar resultados de concursos públicos.
Ontem voltaram a ser inequívocos, na terceira sessão do julgamento em que são arguidos pai, irmão e cunhada do ex-governante – respectivamente, Ao Veng Kong, Ao Man Fu e Ao Chan Wa Choi –, e ainda Tang Kim Man, proprietário da construtora Tong Lei, e Lo Chi Cheong, Leong Chio Tong e Lao Chon Hong, todos funcionários da mesma empresa.
Ambos reiteraram tudo o que haviam dito nos processos conexos, confirmando mais uma vez que o antigo secretário para as Obras Públicas e Transportes era quem decidia, em última análise, quem ganhava projectos de obras públicas lançados pela DSSOPT.
Segundo a Rádio Macau, também mais uma vez as testemunhas não deram mostras de entender que o antigo secretário excedia as suas capacidades governativas ou cometia qualquer ilegalidade.
Jaime Carion referiu que, nos termos do decreto lei 74 de 1999, as avaliações de propostas a concurso contemplam critérios de interesse público e que a Ao Man Long competia equilibrar a distribuição de obras pelas várias construtoras do território, para que não caíssem todas no mesmo cesto. Deste modo, confirmou ter recebido orientações de Ao Man Long para que a empresa Tong Lei ganhasse o projecto do silo do Estádio de Macau, na Taipa. Estas instruções foram passadas ao seu subordinado directo, o então subdirector Chan Hon Kit, actualmente o coordenador do Gabinete para o Desenvolvimento de Infra-Estruturas. Para Carion, não houve nisso qualquer anomalia, já que os reajustamentos a realizar sobre as classificações feitas pelas comissões de avaliação decidiam sobre critérios subjectivos e que diferentes técnicos podiam manifestar diferentes opiniões.
Apenas num caso o director das Obras Públicas disse ter notado um interesse suspeito por parte de Ao Man Long no que diz respeito a um pedido de autorização de um projecto de seis vivendas em Hac Sa, que, segundo a acusação, uma seria cedida à empresa Ecoline, controlada por Ao Man Long, assim que tivesse sido concluído o projecto; que não avançou por não reunir as condições técnicas, disse Carion, que admitiu uma "insistência estranha" do antigo secretário, em perguntar pelo andamento do processo.
Jaime Carion testemunhou também a propósito da troca de um terreno na Taipa, localizado na rua Fernão Mendes Pinto, entre a Administração e uma das empresas de Tang Kim Man. Segundo Carion, a permuta fez-se para que o Governo pudesse avançar com o plano de intervenção urbanística que fará de uma das zonas da Taipa uma área estritamente pedonal.
Quanto ao antigo chefe do departamento das Edificações Públicas e actual assessor do gabinete do secretário das Obras Públicas, confirmou também, mais uma vez, ter recebido de Chan Hon Kit, instruções para que a companhia Tong Lei vencesse o projecto das novas instalações da Capitania dos Portos, na Ilha Verde. Depois, disse, transmitiu estas instruções ao chefe de divisão e que levaram também ao reajustamento das classificações de propostas a concurso público.
Suspeitas
As testemunhas ouvidas ontem de manhã confirmaram suspeitas quanto à forma como a companhia Engenharia Hidráulica de Macau (EHdML) conseguiu algumas empreitadas públicas que subconcessionava depois à construtora de Tang Kim Man, a Tong Lei.
De acordo com o relato da Rádio Macau, Leong Hoi I, que foi funcionário por mais de uma década na empresa que recebeu de concessão obras relacionadas com o tratamento de águas residuais, disse ao tribunal que tinha, na altura, a sensação de que a EHdML conseguia facilmente obras. Esta sensação seria partilhada com suspeitas por outros trabalhadores da empresa e objecto de conversas de escritório. Referiu a testemunha que as suspeitas eram sobretudo mais fortes quanto à forma como a companhia obteve o projecto da construção da ETAR do Aeroporto Internacional de Macau. Richard Robison, o primeiro director da EHdML, mantinha também um relacionamento bastante próximo com Ao Man Long, afirmou ainda a mesma testemunha.
As mudanças na estrutura accionista da Engenharia Hidráulica de Macau foram também temas de várias questões colocadas pelo Ministério Público. O ex-funcionário disse desconhecer a razão de a Tong Lei ter adquirido 20% dos capitais da companhia às portuguesas Teixeira Duarte e Soares da Costa. Do mesmo modo, não se recorda de alguma vez ter visto Tang Kim Man nas instalações da EHdML.
Na acusação consta que o empresário Tang Kim Man terá cedido 10 % das acções adquiridas à companhia Ecoline, administrada por Ao Man Long, a troco de favorecimento na concessão de obras públicas.
Sobre este assunto, foi também ouvido um antigo assessor do ex-secretário, que referiu ter visto o pedido de cedência de quotas da EHdML à Tong Lei, que cabia a Ao Man Long aprovar, mas disse não se recordar de qual o assessor jurídico do gabinete do ex-secretário que deu o parecer sobre o pedido.
Ainda sobre um documento preliminar do Plano de Investimentos da Direcção de Obras Públicas do ano de 2006, encontrado nos escritórios da Tong Lei, com algumas das obras sublinhadas a caneta vermelha. A testemunha referiu que não era uma situação normal que tal documento fosse encontrado nas instalações de uma empresa de construção. A mesma testemunha confirmou também ter visto Tang Kim Man algumas vezes no gabinete de Ao Man Long, mas admitiu que muitas outras pessoas o faziam e que tais contactos eram tidos como normais.
O julgamento prossegue hoje com a audição de mais seis testemunhas.