26.5.08

Portas do Cerco em obras para quase dobrar capacidade de processamento fronteiriço
Novas fronteiras

17 meses, quase ano e meio, é quanto vão levar as obras de melhoramento. O objectivo é aumentar a capacidade de entradas e saídas de pessoas das actuais 300 mil para meio milhão por dia. O arquitecto José Catita, autor dos últimos três projectos de intervenção, faz ao PONTO FINAL algumas revelações até aqui proibidas de trazer para a praça pública

Alfredo Vaz

As obras de melhoramento já em curso implicam alterações ao tráfego automóvel mas a fronteira pedonal deverá manter-se com todos os postos abertos durante as obras. Este é pelo menos o objectivo do dono da obra, a Direcção dos Serviços de Solos Obras Públicas e Transportes. José Catita, o projectista autor das duas primeiras intervenções (inícios dos anos noventa do século passado, e princípios de 2000) e co-autor da mais recente intervenção (com Diogo Zuquete), alerta que “é uma coisa muito difícil de fazer” sem provocar constrangimentos ao movimento normal.
Tirando isso, “a obra não tem nada de especial, é uma ampliação, mas é o mesmo conceito”, revelou Catita ao PONTO FINAL.
O objectivo da obra é aumentar a capacidade de fluxo de tráfego pedonal das actuais 300 mil entradas e saídas para meio milhão por dia.
Para isso vão ser construídos 46 novos balcões, elevando o número total dos actuais 52 para 98, enquanto que os torniquetes de passagem automática para portadores de bilhete de identidade permanente serão aumentados em quase cinco vezes.
A área total do edifício cresce também consideravelmente, dos actuais 17,880 para 23,120 pés quadrados.
Para permitir o ganho da área do edifício fronteiriço reduz-se o número de faixas de rodagem nos canais de trânsito automóvel da fronteira. Actualmente podem passar por dia, nos dois sentidos, 24 mil veículos. Quando as obras estiverem concluídas a capacidade máxima será de 21,600. Como se prevê que o trânsito automóvel continue a crescer fala-se em dois projectos alternativos: canalizar todo o trânsito automóvel para a Ponte Flor de Lótus, e a possibilidade da construção de uma outra fronteira rodoviária junto à Ilha Verde.
Mas enquanto estes projectos não forem viáveis os principais afectados pelas obras do novo posto fronteiriço são mesmo os condutores dos veículos automóveis - ligeiros e pesados, de mercadorias e de passageiros - que vêm os canais de passagem serem reduzidos quase para metade. Nesta fase as saídas e entradas em Macau processam-se por uma única via que funcionará em movimentos alternados. As obras no edifício fronteiriço só arrancam quando estiverem concluídos os trabalhos no eixo rodoviário. A estimativa é que todos os melhoramentos possam estar concluídos até finais de 2009, princípios de 2010.

Pressões e retaliações

A evolução da zona da Porta do Cerco está indelevelmente associada a períodos importantes da história de Macau (ver caixa), e até a movimentos geopolíticos que extravasam as fronteiras do território.
Até inícios dos anos noventa do último século a Porta do Cerco separava geograficamente Macau, território sob administração portuguesa, da República Popular da China. Até então passava-se a pé pela Porta do Cerco a caminho da fronteira chinesa, tendo pelo meio a chamada ‘Terra de Ninguém’.
A necessidade de se criar um posto fronteiriço do lado de Macau diz-se que só aconteceu por pressões do governo norte-americano.
Os Estados Unidos queixavam-se que a falta de fiscalização permitia
que produtos feitos na China passem-se por Macau e saíssem do território com a etiqueta Made in Macau em vez de Made in China. Estas queixas e pressões das autoridades americanas levaram a que a Administração do Governador Carlos Melancia decidisse mandar construir o primeiro posto fronteiriço. O arquitecto contactado foi José Catita. Como o próprio recordou ao PONTO FINAL: “Só não nos encomendaram propriamente um barracão porque a proximidade do próprio monumento era objecto de ter que se ter algum cuidado, porque – apesar de tudo – aquela Porta é um ‘ex-libiris’ de Macau. Foi o que tinha que ser. Mas depois disso, mais nada. E em 2002 só voltei a ser contactado, agora já pela Administração da RAEM para fazer este novo projecto, nascido da necessidade de fazer frente ao aumento súbito do número de utilizadores.”

Catita conta “toda a verdade”

Assim, o segundo projecto, o primeiro sob administração chinesa, acaba por estar também ligado a uma nova fase da vida da Região. Catita lembra que alguém em Macau se terá ‘esquecido’ de negociar primeiro com as autoridades do município de Zhuhai o espaço limite até onde poderia ir o novo edifício, que já caia em cima da “Terra de Ninguém. Como ‘retaliação’, as autoridades vizinhas reclamaram contra o facto de, no projecto apresentado, a bandeira chinesa, erguida na ‘Terra de Ninguém”, estar dentro do edifício. José Catita diz que agora já pode contar pela primeira vez toda a verdade: “ O que se passou foi que mandaram-nos fazer o projecto com orientações especificas de ter um certo cuidado com o Arco da Porta, e nós fizemos o projecto nesse contexto. Com uma outra imposição na altura feita pelo então Secretario das Obras Públicas Ao Man Long: a de que o edifício só poderia ter um piso. Nós assim fizemos o projecto. E quando ele estava já feito, entregue e pago, é que ele foi apresentado às autoridades de Zhuhai. O único ponto que então observaram foi o facto da bandeira chinesa ficar dentro do prédio (devido a limitações de espaço impostas pelo dono da obra), o que obrigava a fazer um projecto totalmente novo, não se podia cortar o desenho inicial em postas. Aí, o Governo da RAEM, confrontou-se com ter que me encomendar um segundo projecto, que me pagou também por inteiro. Mas com a obrigação moral que eu tinha, como cidadão desta cidade, de não contar nada aos media enquanto estivesse tudo em construção, e que ninguém – publicamente – podia saber que eles se tinham enganado, e que estavam a encomendar outro projecto. Agora já posso contar a verdade. Ou seja, a bandeira tinha que ficar no sítio onde estava, e onde está nos dias de hoje. Fiz então este projecto, que é um edifício que tem uma forma circular onde acabei por organizar o edifício em função da bandeira, do ‘monumento’ da China, a bandeira nacional. Essa é a razão porque o edifício tem aquela forma circular, centrado na bandeira. Depois, ficou como foi possível”, lamenta o arquitecto projectista.

CAIXA
Portas do Cerco, um breve historial

O Arco das Portas do Cerco (edifício de cor amarela) foi erguido em 1870 pelo Governo de Macau para homenagear os feitos heróicos do Governador Ferreira do Amaral e do Coronel Mesquita. Neste arco, estão gravados as datas do assassínio do Governador (22 de Agosto de 1849) e da batalha do Passaleão (25 de Agosto de 1849).
As Portas do Cerco que servia de fronteira terrestre entre Macau e a China e foi construída pelos Portugueses no ano de 1849, mas as iniciais Portas do Cerco foram erguidas pelos Chineses no ano de 1573 onde existia uma inscrição que dizia “ TEMAM A NOSSA GRANDEZA E RESPEITEM A NOSSA VIRTUDE “.
O Arco foi preservado até aos dias de hoje, tendo sido ‘protegido’ quando as últimas grandes intervenções, de inícios de 1990, e de 2002 e 2003.
A primeira grande reestruturação, desenhada com condicionalismos pelo arquitecto José Catita (ver texto principal) começou em 1990 e o posto fronteiriço começou a funcionar em 1992.
Em 2000, o no Governo da Região Administrativa de Macau encomendou um novo plano a José Catita. O novo posto fronteiriço foi inaugurado a 15 de Janeiro de 2004.
As obras da mais recente remodelação começaram há algumas semanas com a destruição parcial dos canais laterais de passagem do tráfego automóvel.

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